GUERRA AO AÇÚCAR
Até que distância um Rolls Royce chegaria usando uma gasolina de baixa qualidade?Nossa saúde e bem- estar também estão relacionados à qualidade dos nutrientes processados pelo organismo. Isso é especialmente
importante quanto aos carboidratos, os quais incluem o presságio final de má saúde: o açúcar. Foi o açúcar que
sobrecarregou os carboidratos com tão péssima reputação. É o açúcar que transforma o pão doce num assassino.
Juddy Mazel
Paulada na ADA (American Diabetes Association)
A ADA edita um manual intitulado Guia completo sobre diabetes, do qual adquiri a
tradução brasileira da Anima Editora. Foi uma frustração: o livro é enganador na forma e
no conteúdo. Tem a forma de um catálogo telefônico, com 608 páginas, e custou R$ 90,00,
mas caberia num volume de 300 páginas que deveria custar no máximo R$ 30,00.
O livro é cheio de quadros sobre diversos assuntos. Dois deles nos interessam
diretamente e deixam claro a que veio o Guia. O quadro da página 28 comenta a frase o
gosto por doces é uma marca de minha família. Meu pai ficou diabético de tanto comer
açúcar . Essa assertiva é correta e faz parte da anamnese de todo diabético. O comentário
tendencioso do manualzão começa com o conhecido blá-blá-blá da diabetologia para dar
em seguida o recado principal, comer muito açúcar não causa diabetes , e prosseguindo
na defesa do indefensável: Faz pouca diferença se os quilos a mais (do obeso) provêm de
balas, biscoitos ou bolinhos de carne . Para os médicos adeptos da teoria das calorias a obesidade é uma só, tenha você
consumido carne ou açúcar. Ao contrário: o açúcar branco, principalmente, e
secundariamente o trigo e o arroz brancos, são responsáveis pela gordura branca e pela
obesidade mórbida. O gordo que come carne é um gordo saudável, cheio de gordura
marrom. Aguardemos as pesquisas que venham a esclarecer o assunto. .A carne alimenta a
humanidade desde que ela existe, enquanto o açúcar é apenas um agente químico que foi
acrescentado ao pão nosso de cada dia há apenas poucos séculos. Em outro trecho, o Guia
reproduz uma declaração: Quando tinha diabetes do Tipo 2, eu disse não ao açúcar. Acabou-se o açúcar no chá, acabaram-se os bolos, biscoitos e tortas, e nada de geléia na
torrada. Até mudei a marca do meu creme de amendoim favorito porque tinha açúcar . Uma decisão dessas devia ser tomada por todos, não apenas pelos diabéticos. Isto
significaria uma vida saudável, longe de médicos, remédios e hospitais. Mas o manualzão da
ADA classifica-a como sendo medida extrema e aconselha: Pode-se incluir alimentos
açucarados no plano alimentar do diabético . Para continuar a defender o indefensável, novo blá-blá-blá diabetológico, que inclui algumas confusões conceituais.
Diz, por exemplo, que açúcares como frutose e sacarose e os amidos são digeridos
no mesmo ritmo . Na verdade, a frutose não precisa de digestão nenhuma; do jeito que
entra pela boca vai para o sangue, isso no intestino delgado. A frutose tem inclusive um
meio próprio de absorção diferente do da glicose. A sacarose, vulgo açúcar, esta necessita
de digestão, ou, como diriam os químicos, precisa ser hidrolisada por meio ácido ou
enzimático, e o amido, que pode ter milhares de moléculas de glicose, necessita de uma
digestão muito mais complexa e demorada.
Para completar o absurdo, diz o manualzão que o açúcar tem pouquíssimo valor
nutritivo . Fico encabulado de ter que corrigir a American Diabetes Association, mas o
valor nutritivo do açúcar é ZERO! Ou melhor, é abaixo de zero, na medida em que além
de não acrescentar nada ele vai subtrair nutrientes do organismo de quem o ingeriu. Eles
têm a coragem de propor aos diabéticos que consumam açúcar moderadamente , desde
que em troca comam menos alimentos de verdade, como o pão ou carne. Ou, pior ainda, compensem a ingestão do veneno doce com o antídoto, isto é, a injeção de insulina. Mondo
cane é isso aí.
Só existem três categorias de alimentos: carboidratos, gorduras e proteínas. Logo, qualquer pirâmide alimentar teria que ter apenas três blocos. A indústria da doença inventou a famosa dieta balanceada ou equilibrada, baseada
na famosa pirâmide, mais ou menos nas seguintes proporções: entre 50 e 60% de
carboidratos; entre 25 e 30% de gorduras; e entre 15 e 20% de proteínas.
Até aí tudo bem, só que essa é uma seara complicada. Basta considerarmos que o
carboidrato não é um nutriente essencial: se você não ingerir carboidrato, seu corpo extrairá
energia das proteínas e gorduras que forem ingeridas.
Segundo a nutricionista Rebeca de Angelis, cada população muda as proporções
de sua alimentação em gorduras e carboidratos de acordo com hábitos, disponibilidade,
clima etc. (...); em certos locais o alimento principal é carne e peixe .130
Ainda segundo essa autora, grande parte das populações asiáticas, da América
Latina e do Médio Oriente obtém 80% ou mais do total calórico, de grãos, tubérculos e
raízes (...); a distribuição gordura/ carboidrato varia em média de 10 a 50% das calorias
totais para diferentes populações . A pirâmide alimentar da American Diabetes Association tem seis blocos; tem até
um cantinho para doces, álcool e gorduras. Ora, nem álcool nem açúcar são alimentos. Ainda bem que a ADA não teve a coragem de recomendar porções de álcool nem de
açúcar, apenas pede parcimônia. A gordura, o alimento nobre dos ácidos graxos e das
vitaminas A, D, E e K, está encarcerada entre os doces e o álcool.
Chamo a atenção para o detalhe de que, no contexto da dieta açucarada moderna, todos os blocos da pirâmide, sem exceção, estão contaminados pelo açúcar. No bloco dos
vegetais, os enlatados (milho, ervilhas) levam açúcar. Entre os laticínios encontramos
iogurtes e queijos açucarados. No bloco das carnes, os embutidos (presuntos, mortadelas
etc.) contêm açúcar. Sucos e até polpa de frutas são também igualmente adulterados com
açúcar; e especialmente a base da pirâmide, onde ficam os cereais refinados, é o paraíso do
açúcar.
Em resumo, a pirâmide da ADA é toda açucarada, com rima e tudo.
As mentiras da Coca-Cola
O site da Coca-Cola,o www.cocacolabrasil.com.br , tem uma seção de perguntas e
respostas que está cheia de sofismas, meias verdades e mentiras.
Citarei aleatoriamente alguns absurdos e farei um comentário em seguida a cada um
deles.
Não existem alimentos bons e ruins, e sim dietas ruins. O que a Coca-Cola pretende com essa afirmação é passar a idéia de que você, no
contexto de uma dieta saudável, pode incluir um alimento ruim, uma garrafa de Coca-Cola,
por exemplo, ou um pudim de leite condensado. A simples inclusão de um copo de
refrigerante numa dieta já a desequilibra, tornando-a ruim.
A Coca-Cola acha que você pode manter a dieta saudável se ao acrescentar as
calorias inúteis de um copo de refrigerante você subtrair uma porção de comida de verdade
para preservar o nível de calorias totais. Utilizando-me do vocabulário aprendido com a
ADA, você estará trocando carboidratos nutritivos por carboidratos não nutritivos. Refrigerantes contribuem para uma alimentação sadia. O comentário que fiz à primeira citação já responde a essa segunda, mas não me
farei de rogado.
A Coca-Cola acha que o refrigerante contribui com água e com açúcar. Essa
contribuição é incompatível. Nenhum médico recomendaria refrigerante a um triatleta
130 Angelis, R.C. Op. cit., pp. 24 e 30.
numa competição, porque refrigerante desidrata. O que a água da Coca-Cola dá, o açúcar
que ela contém rouba. O açúcar desidrata, desmineraliza e desvitaminiza.
A Coca-Cola fornece carboidratos facilmente usados pelo organismo como
fonte de energia. O comentário anterior já responderia a essa também, mas de novo não me farei de
rogado. Os carboidratos mais facilmente utilizados pelo organismo são glicose e frutose, açúcares simples encontrados nas frutas e no mel, e que não precisam de hidrólise: são
assimilados diretamente. Sendo a Coca-Cola adoçada com açúcar refinado (sacarose), o
organismo, antes de assimilá-lo terá que hidrolisá-lo ou por meio de ácido clorídrico do
suco gástrico ou pelas enzimas pancreáticas do intestino delgado. Essa hidrólise é onerosa
para o organismo - ela acontece em detrimento de água, vitaminas e minerais roubados do
organismo.
Coca-Cola fornece menos calorias que um copo de suco de uvas. É verdade: logo, o suco de uvas, além de mais rico em calorias, esbanja aquilo que a
Coca-Cola não tem - vitaminas, sais minerais e proteínas - e ainda combate os radicais
livres da última Coca-Cola que você tomou.
Açúcar é seguro para a saúde, exceto pela associação para a formação de
cárie. A expressão sem comentários já seria suficiente para este absurdo. A saúde não
começa pela boca? Um troço que prejudica o tecido mais duro do corpo humano, o
esmalte dos dentes, o que não faz com os mais delicados? Se açúcar provocasse apenas
cárie dentária, a mais vergonhosa das epidemias que afligem a humanidade, isso já não seria
motivo suficiente para banir o açúcar da mesa?
O organismo não diferencia entre o açúcar do refrigerante e o natural, metabolizando-o da mesma forma. Como não diferencia?! Primeiro, o açúcar natural das frutas e o do mel são
assimilados diretamente; o da Coca-Cola requer uma hidrólise onerosa para o corpo. Segundo, todos os alimentos fornecem energia na forma de açúcares naturais, ácidos
graxos ou aminoácidos, logo o açúcar da Coca-Cola é supérfluo e vai forçar o pâncreas a
produzir insulina extra para transformá-lo em gordura. E finalmente o açúcar da Coca vem
acompanhado de um lixinho químico fino que inclui metais pesados e resíduos tóxicos. E
ainda ia me esquecendo do problema das cáries. O organismo teria que ser muito burro
para não notar essas diferenças.
O tempo de contato do açúcar ou de qualquer outro carboidrato com os
dentes é mais importante que a quantidade de açúcar para a formação de cárie. Os
refrigerantes passam rapidamente pelos dentes. A bactéria que produz a cárie, Streptococcus Mutans, só trabalha em parceria exclusiva
com a sacarose refinada. Qualquer outro carboidrato, não. Ela é justamente chamada pelo
pessoal da odontologia preventiva de sacarose-dependente. Portanto, dizer que qualquer outro
carboidrato provoca cárie é mentira da Coca-Cola: a batata-doce, por exemplo, não
provoca cárie. Se o qualquer outro carboidrato for sucrilhos, biscoito recheado ou
sorvete, vá lá que seja: são produtos açucarados. E também duvido que um xarope
pegajoso como a Coca-Cola passe rapidamente pelos dentes. E a saliva, ao contrário do
que a Coca-Cola diz, em vez de lavar os dentes transporta a bactéria cariogênica.
Todos os açúcares, mesmos os naturais, as frutas e os cereais podem
contribuir para a formação de cárie. Sei não, mas sinto nessa afirmação um pouco de desespero de causa. Responderei
com a citação do Dr. Humberto Gomes e Souza e Filho, cirurgião-dentista do Centro
Odontológico CAARJ: A cárie dentária requer como um pré-requisito uma massa crítica
de bactéria cariogênica, e essa massa crítica pode ser obtida somente na presença de
sacarose, um substrato no qual a bactéria cariogênica prospera. A infecção bacteriana é
necessária mas não suficiente para desenvolver a cárie, que requer a presença de sacarose . Entendeu, dona Coca? O doutor disse somente sacarose. A Coca-Cola não está preocupada com o lado nutritivo da coisa, mas
apenas com um produto que seja associado a sabor agradável e a alegria. Gostei da franqueza. Não está preocupada também com o lado patogênico da coisa. É melhor assumir. Está na Bíblia que nem só de pão vive o homem; está no site da Coca- Cola que nem só de pão de verdade vive o homem. Você pode ter um simulacro de pão
com sabor artificial agradável e que seja associado, pelas modernas técnicas de propaganda, com a alegria de viver. Essa é a real . Açúcar na mídia
A indústria de açúcar não precisa fazer propaganda direta, mas mesmo assim o faz
associando o produto a prazer e energia . Tenho visto muito o açúcar em propaganda
indireta do tipo merchandising. Nas novelas da Globo, em horário nobre, é só prestar atenção, cenas de festas e jantares são freqüentes e geralmente o que aparece na frente é
um bolo, doce ou chocolate; o açúcar pode se dar ao luxo de ficar escondido. Poucas
pessoas sabem que se faz bolo com mel ou adoçante e que isso resulta num bolo saudável,
ao passo que o bolo feito com açúcar é patogênico.
Outro dia, numa das novelas da tarde, da Globo, no V alea pena ver denovo, aparecia
o ator Eduardo Moscovici aprendendo desajeitadamente a fazer um bolo: a colher de pau, cheia de açúcar, aparecia em close. E a cena se repetia minutos depois para mostrar que ele
aprendera a fazer.
Outro tipo de propaganda de açúcar vem de contrabando na parte de culinária da
programação. Não à toa, os próprios fabricantes de açúcar editam livros de receitas, e o
critério de seleção dos pratos deve ser a quantidade de açúcar que a iguaria leva.
Tenho pra mim que a indústria de açúcar deve contratar Think Tanks (empresas
que são espécies de usinas de idéias) para descobrir meios de aumentar o nível de açúcar da
dieta. Já percebi que pratos que levam grandes quantidades de açúcar levam ao mesmo
tempo sal, pimenta e vinagre. O objetivo evidentemente é abafar o dulçor e empurrar mais
açúcar no prato, espécie de maquiavelismo culinário. Ainda hoje Ana Maria Braga mostrava
como abafar o açúcar de uma fatia de brownie, pasmem, com azeite de oliva. E apresentou
uma novidade: geléia de azeitona. Vou consultar meus amigos da área de tecnologia de
alimentos para saber se a indústria alimentícia não está usando aditivos químicos com esse
objetivo. Açúcar é o produto químico puro mais barato do mundo. Quanto mais for
empurrado no gogó do ser humano mais dinheiro os traficantes ganham.
O programa de Ana Maria Braga na TV Globo deveria ganhar um diploma de
Honra ao Mérito dos fabricantes de açúcar, pela quantidade de doces e bolos apresentados
em seu programa. O louro José até já comentou que a dieta que o programa defende é a
dieta da lua: comer até virar uma bola.
Outro dia Ana Maria recebeu em seu programa Marília Gabriela, que ficou surpresa
com um palito de canela com cobertura de chocolate que havia à mesa: Isso não
engorda? , perguntou Marília. Ana Maria ficou constrangida, sem ter o que falar. Marília, raciocínio rápido, percebeu e disparou, com um sorriso: Eu adoro chocolate! Pena que o
louro José não comentou: Chocolate engorda, sim, Marília, mas é por causa dos 50%
de açúcar que ele contém . Curupaco papaco!
Simbolicamente, no programa do dia de finados, a receita da vez era uma torta de
banana que fora apresentada no dia anterior no jornal Hoje e originou uma demanda de l00
mil pedidos pela internet. A reportagem focalizava primeiro a banana com direito a
imagens de um bananal, informações de enciclopédia sobre o Brasil como grande produtor
da fruta e uma nutricionista falando sobre as virtudes da banana. O que a torta apresentada
tinha de novo ? Era a velha torta de banana da vovó que a empresária cearence Daniela
Barreira adulterou acrescentando mais leite condensado. Uma torta de banana se come
com garfo e faca. A torta de Daniela é toda molenga de tanto leite condensado, de modo
que quem quiser se suicidar comendo dela tem que usar a colher. Impressiona a
manipulação: os profissionais da nutricão são chamados para falar das virtudes nutritivas da
banana para ajudar a vender uma torta encharcada de leite condensado.
Já ví o Maurício Kubrusly mostrando um doce que só não era açúcar puro porque
levava um copo de leite de côco. Outro doce que me chamou a atenção, salvo engano
apresentado no Fantástico, era feito com meio quilo de açúcar, pimenta e abacaxi (exemplo
de maquiavelismo culinário).
Outro dia no Bom Dia Brasil um chef mostrava como fazer coisas com chocolate:
gravata borboleta, brinco, cigarrilhas, cestinhas, tudo esculpido em chocolate. A cena para
mim era um símbolo perfeito do apogeu da civilização do açúcar. A narradora lembrou a
origem asteca do chocolate, falou do chocolate amargo e da famosa teobromina, só
esqueceu de um ingrediente... E por ocasião da Páscoa o supermercado Sendas colocou no
ar um coral de crianças cantando aquela música de Marisa Monte que diz eu só quero
chocolate tendo censurado o trecho que diz não adianta vir com guaraná , substituído
por não adianta vir com outra coisa . Guaraná é o principal transportador de açúcar para
a barriga das crianças. Um anúncio dirigido a milhões de crianças, sob a ditadura do açúcar
, jamais faria qualquer restrição ao maior transportador de açúcar para a barriguinha dessas
mesmas crianças.
Tenho notado também o açúcar infiltrado como sujeito oculto em propaganda de
coisas que nada têm nada a ver com açúcar - provavelmente a indústria de açúcar paga pela
inserção. Recentemente a belíssima Ana Paula Arósio comparava o custo de uma ligação
telefônica ao preço de uma balinha . Outra propaganda da Renault mostrava uma mulher
grávida desejando e pedindo a seu marido jujuba e quindim; e o Sedex mostrava sua grávida
pedindo goiabada, sem nenhuma advertência do Ministério da Saúde falando dos riscos de
diabetes gestacional, pré-eclâmpsia e endometriose.
Quando começou a série Questão de peso apresentada por Dráuzio Varela no
Fantástico, pensei que o açúcar fosse o ator principal. Qual o que, ele foi cirurgicamente
cortado do elenco. Obesidade para o doutor Varela resulta de um superávit de calorias. O
açúcar não alimenta e é pura caloria mas quem viu o programa não percebeu isso. O foco
principal era a diabolização da gordura. Uma gordinha de uns 150 quilos aparecia
saboreando uma picanha suculenta de tanta gordura. Meus amigos da Amapica
Associação dos amigos e amigas da picanha ficaram revoltados. Pena que o doutor Varela
não estava comentando o Globo Repórter que dias depois mostrava esquimós siberianos
que comem um quilo de carne vermelha todo dia. Carnes e gorduras não acionam a
insulina será que o doutor não sabe disso?
No mesmo Fantástico pessoas magras apareciam comendo fatias de um bolo de
noiva. À dona Benta que fez o bolo foi feita uma perguntinha inocente, queriam saber como
se faz aquela misteriosa camada branca que envolve todo bolo confeitado. A doceira olhou
meio perplexa e respondeu Açúcar! . Foram mostrados filmes em preto e branco com
imagens de São Paulo dos anos 20 do século idem, onde não se via obesos nas ruas. O
doutor Varela devia dizer que naquele tempo os paulistanos consumiam em um ano a
quantidade de açúcar que hoje comem em um mês. Enquanto isso o reality show do SBT
engaiolava gordinhos com o objetivo de perder peso. Um dia Silvio Santos submeteu-os a
torturante tarefa de fazer bolos e doces. Uma gordinha lambeu o dedo sujo de chocolate e
gerou polêmica. O recado é o seguinte: nós os normais podemos comer doces e bolos à
vontade, eles os obesos estão proibidos . No último Fantástico que vi foi exibida uma reportagem condenando o aspartame, baseada em pesquisa que sequer havia sido publicada em revista científica. Sobre outro
adoçante, a sucralose, a respeito do qual existe farto material publicado, na Globo não
aparece nada. Talvez o fato da sucralose ser um adoçante fabricado a partir do próprio
açúcar explique a omissão. A matéria mencionou o caso de um menino que chupava bala
adoçada com aspartame para evitar cáries. O jornalismo inteligente da Globo deixou a
conclusão para o telespectador qual é pior cárie ou câncer? . A guerra psicológica que a
ditadura do açúcar move contra os adoçantes é tão terrível que é rara a pessoa que ao ouvir
a palavra adoçante não lhe venha à mente a idéia de câncer. No entanto, como vimos, com
menos de trinta gramas de açúcar se mata um enorme rato de laboratório. Ninguém sabe
disso.
Outro filão explorado pela mídia em horário nobre é o fato de instintivamente o ser
humano preferir o sabor doce ao amargo. Por duas vezes o assunto foi ao ar, uma
apresentado por Dráuzio Varela, outra pelo ator Lázaro Ramos. Foi mostrado um bebê
torcendo o nariz para uma papinha de jiló e feliz comendo algo doce. O narrador
aproveitava para dar o recado açúcar é energia . Nem o médico nem o ator explicaram
que o doce que por instinto de sobrevivência procuramos é o doce das frutas e do mel e
não o daquele pó branco extraído de um capim e asociado a cárie e outas doenças crônicas.
O bebê como todos aqueles que comem açúcar estão sendo enganados.
Considerando toda essa propaganda direta, indireta , oblíqua e subliminar o açúcar
está presente numa larga fatia (share) de tudo que é anunciado pela televisão.
Diante de uma situação dessas não espanta o fato de o Brasil ser um país de
cariados e desdentados. Pesquisa realizada em 1999 comparando a saúde bucal de 186
países colocava o Brasil no indizível 129º lugar.
William Dufty responde
A revista Saúde, de abril de 2001, traz uma matéria sobre açúcar constituída de dez
perguntas feitas pelos leitores e respondidas com base em especialistas em alimentos, diabetes e nutrição. Ao fim da matéria um quadro chama a atenção para o Sugar blues, que
aparece como um cão que ladrou nos anos 80 enquanto a caravana do açúcar passava. O
escriba autor destas mal traçadas, apesar de materialista empedernido, tem uma
mediunidade enrustida que não é receptiva a qualquer espírito, mas o de William Dufty
baixou, leu a matéria e não gostou: achou a reportagem muito tendenciosa a favor do
açúcar. Fiz aqui o papel de Chico Xavier e psicografei o autor de Sugar blues, que fez
questão de responder novamente às perguntas dos leitores da revista Saúde . Pergunta de Wagner de Sales, Barão de Cocais, Minas Gerais: Comer muito açúcar faz
alguém ficar diabético?
Resposta da revista: O risco existe , confirma o diabetólogo carioca Leão Zaguri, da Sociedade Brasileira de Diabetes. Sempre que se come açúcar, o pâncreas precisa liberar
insulina, hormônio responsável pela entrada da glicose nas células. O estímulo freqüente
pode desgastá-lo se há a predisposição . A sobrecarga é maior com o açúcar branco, que
eleva depressa a glicose em circulação. Além disso, exagerar nos doces favorece a
obesidade, fator de risco para o diabetes Tipo 2 dos adultos.
William Dufty Caro Wagner, uma pessoa pode fumar cigarros a vida inteira e
não contrair câncer. Da mesma forma alguém pode consumir açúcar e nunca ficar
diabético. Mas isso não elimina o fato de que cigarro causa câncer e açúcar causa diabetes. O que acontece é que vivemos sob a ditadura institucionalizada do açúcar, que controla até
a ciência e por isso não se fazem as pesquisas necessárias para pôr esse assunto em pratos
limpos. Restam-nos as evidências epidemiológicas. Nos Estados Unidos, por exemplo, cada americano come oitenta quilos de açúcar por ano e os novos casos de diabetes
ultrapassam os 800 mil por ano.
2. Pergunta de Rosely Corrêa da Silva, de Guarulhos, São Paulo: Qual a diferença
entre os diversos tipos de açúcar?
Resposta da Revista: Até a cana virar açúcar, passa por várias etapas. E o número
dessas etapas é um dos grandes diferenciais , diz Paulo César Esteves de Lira, engenheiro
de alimentos da Coopersucar. Quanto mais próximo da cana, em princípio, melhor para a
saúde. Nesse sentido, o mascavo sai ganhando desde que se observe a procedência , nota o nutricionista Henrique Freire Soares, da Universidade de Brasília. Ele tem maior
tendência a fungos e sujeira . William Dufty Prezada Roseli, os açúcares ideais para consumo humano
encontram-se nas frutas e no mel de abelhas e chamam-se glicose e frutose. Já os açúcares
industrializados, a principal diferença entre eles é que uns fazem mais mal e outros menos
mal.
O açúcar refinado é sacarose quase pura e 0,5% de lixo químico fino. O mascavo
constitui-se de aproximadamente de 98% de sacarose e os 2% restantes englobam um
resquício de substâncias nutritivas é muito pouco nutriente para justificar o risco de cáries
dentárias, obesidade e diabetes.
3. Pergunta de Valéria França, de Petrópolis, Rio de Janeiro: O que é o açúcar
invertido que a gente vê nos rótulos dos alimentos?
Resposta da Revista: A molécula de sacarose é, na verdade, uma molécula de
glicose ligada a outra de frutose. Graças a uma reação denominada inversão, a gente
quebra seus elos, gerando moléculas independentes , explica o engenheiro de alimentos
Paulo César Esteves de Lira. Isso resulta em propriedades como a resistência à
cristalização por isso, o doce industrializado nunca forma carocinhos de açúcar como às
vezes acontece com o doce caseiro.
William Dufty Prezada Valéria, o açúcar (sacarose); é uma substância de reserva
que armazena, ligadas entre si, duas moléculas de açúcares simples que são os verdadeiros
açúcares: glicose e frutose. A sacarose é fonte desses açúcares; eles é que são fonte de
energia. A sacarose, para ser utilizada pelas plantas ou pelo ser humano, tem que primeiro
ser hidrolisada, isto é, suas moléculas têm que ser partidas em moléculas de glicose e
frutose, por meio de ácidos ou de enzimas. Diz-se que é invertido porque a frutose é
levógira e a glicose é dextrógira, ou seja, uma gira à luz polarizada para a esquerda (a
frutose) e a outra para a direita (a glicose). Com a hidrólise há uma inversão no sentido do
desvio do plano de polarização da luz, seja lá o que isso queira dizer. Em termos práticos o
açúcar invertido é uma espécie de açúcar derretido que faz tanto mal quanto o outro, apenas acrescenta calorias inúteis ao alimento.
4. Pergunta de Márcia Mattiolli, de São Paulo, São Paulo: Quantos gramas de
açúcar um adulto pode consumir por dia?
Resposta da Revista: Cada pessoa tem uma necessidade diária de açúcar conforme a
energia que gasta no seu dia-a-dia. É preciso levar em conta o peso, a altura, o sexo, o tipo
de atividade profissional e se pratica exercícios ou não. Além disso, o cálculo deve
considerar todos os alimentos da dieta, muitos dos quais já contêm açúcares , acrescenta
Mônica Inês Jorge, nutricionista da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São
Paulo.
William Dufty Estimada Márcia, o ideal é não consumir nem um grama sequer. Ninguém tem necessidade de açúcar refinado. TODOS os alimentos além de nutrir
fornecem a energia de que o corpo precisa: os carboidratos, as gorduras e até as proteínas. O açúcar do açucareiro, além de não acrescentar NADA, ainda vai roubar do organismo
água, minerais e vitaminas.
5. Pergunta de Evelin T. Lavelli, de Capivari, São Paulo: Qual a diferença entre
os carboidratos do açúcar comum e aqueles dos pães?
Resposta da Revista: A sacarose do açúcar branco refinado tem uma estrutura
simples, por isso é absorvida rapidamente e logo vira glicose no sangue. Já os açúcares dos
pães e dos cereais são moléculas complexas que demoram mais para se tornar glicose, porque precisam passar por um longo processo dentro do organismo , explica Monica Inês
Jorge, nutricionista da Faculdade de Saúde Pública da USP.
William Dufty Cara Evelin, os açúcares verdadeiramente simples são a glicose e
a frutose contidos nas frutas e no mel. Eles são assimilados do mesmo jeito que são
ingeridos, não necessitam ser hidrolisados
Os cereais (de que é feito o pão), como são constituídos de muitas moléculas de
glicose, não raro milhares delas, exigem uma digestão lenta e a glicose é liberada
lentamente.
O açúcar do açucareiro não merece consideração, já ao chegar à boca vai alimentar
a bactéria que provoca cárie. É melhor cuspi-lo fora.
Quanto ao pão, Evelin, prefira o integral sem adição de açúcar. Pois até no pão
integral comum colocam açúcar.
6. Pergunta de Ítalo Mendanha, Santa Vitória do Palmar, Rio Grande do Sul:
Qual o trajeto do açúcar no corpo?
Resposta da Revista: 1. Ele começa a ser digerido na boca pela enzima amilase, presente na saliva. 2. No intestino outras enzimas quebram os açúcares em unidades
menores, até virar glicose. Só o açúcar branco pode ser absorvido diretamente , diz
Dolores Rosenthal, fisiologista da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 3. As
moléculas atravessam a membrana intestinal e caem na corrente sanguínea. 4. A glicose no
sangue faz o pâncreas liberar a insulina, que permite a sua entrada nas células do corpo. 5. Nas células, ela pode ser queimada, gerando energia. 6. Quando não há necessidade de
muita energia, a sobra poderá ser armazenada como glicogênio no fígado. 7. Se esse
armazém estiver lotado, o restante irá virar gordura. Acumulada nos pneus do corpo.
William Dufty Prezado Ítalo, você perguntou sobre açúcar e a revista
respondeu sobre carboidratos gerando confusão. Quando um carboidrato natural chega na
boca- batata doce por exemplo que agarra nos dentes- é recebido pela ptialina que começa
a transformá-lo em maltose, isomaltose e dextrina. Os açúcares de verdade, naturalmente
contidos nas frutas, no mel e nos cereais, são digeridos no estômago, assimilados pelos
intestinos e metabolisados nas células, alimentando e fornecendo energia ao corpo. Se
forem consumidos gulosamente resultarão em gordura saudável. Já o famigerado do
açucareiro, na boca ele é recebido pela bactéria S. Mutans que com ele vai produzir os
ácidos necessários à destruição dos dentes. No estômago ele acidifica o meio irritando as
mucosas, favorecendo o aparecimento de úlceras e a proliferação da candida albicans, e no
intestino provoca desequilíbrio osmolar, favorecendo diarréias. No trajeto ele induz o
pâncreas a trabalhar forçado na produção de insulina extra, que ao longo do tempo irá
provocar uma série de distúrbios metabólicos. A insulina empurra a glicose para dentro das
células dos músculos. Nos outros tecidos do corpo o açúcar extra provocará a glicação
degenerativa. E como todos os alimentos já nutrem e fornecem energia, o açúcar do
açucareiro é, em qualquer quantidade, supérfluo e nocivo. Em tempo: Dona Dolores se
enganou, açúcar branco demanda hidrólise, não é absorvido diretamente, como ela disse.
7. Pergunta de Patrícia Feijó, Pelotas, Rio Grande do Sul. É certo cortar o
açúcar branco da dieta infantil?
Resposta da Revista: Ele não é um item essencial na alimentação da criançada, que
pode obter a energia para o seu desenvolvimento de outras fontes. Mas, cá entre nós, cortá-lo é missão quase impossível, porque muita comida industrializada tem açúcar branco
na sua composição. A rigor, a lista de restrições ficaria gigantesca! Na prática, seria desastre
na certa. Uma atitude saudável e viável é nunca adoçar sucos nem leite, que já contêm
açúcares naturais , orienta Mauro Fisberg, especialista em nutrição infantil da Universidade
Federal de São Paulo.
William Dufty Estimada Patrícia, o açúcar branco, mascavo ou demerara deve
ser cortado não só da dieta infantil, da do adulto também. O açúcar na dieta das crianças só
serve para provocar cárie, obesidade, diabetes, etc. Vale a pena encará-lo só por causa do
gosto doce duvidoso e melequento? Colocar açúcar na dieta das crianças é um verdadeiro
crime de lesa humanidade.
8. Pergunta de Lívia Cristina Menezes, de Birigui, São Paulo. Ouvi dizer que o
açúcar atrapalha a quem deseja definir os músculos. Isso é mito?
Resposta da Revista: Segundo Tatiana Dall Agnol, da Nutrylife, há muita confusão. O açúcar faz a gente engordar e a gordura extra não deixa o ganho de massa muscular
ficar evidente , diz ela. O certo é consumir doces com moderação e adequar o programa
de exercícios. Não basta levantar peso. Para que os músculos apareçam deve-se fazer
atividade aeróbicas capazes de queimar as gorduras , orienta o fisiologista Turíbio de
Barros Leite, da Universidade Federal de São Paulo.
William Dufty Cara Lívia, a Tatiana têm razão quando diz que o açúcar engorda
e a gordura extra impede a definição dos músculos. Agora quanto a esse papo de o certo
é consumir doces com moderação : se o doce for feito com mel de abelha consuma-o com
moderação; quanto às porcarias doces feitas com açúcar, não existe moderação com o
que é nocivo à saúde. Para porcarias açucaradas, tolerância zero!
9. Pergunta de Alcione Person Rosa da Silva, de Santo André, São Paulo. O
cérebro fica viciado?
Resposta da Revista: Quem sempre come doces pode atacar a sobremesa quando
cai a glicose no sangue. Para o fisiologista Ivan Piçarro, da Unifesp, isso está mais para
compulsão do que para vício . Mas para Pitágoras Machado, do Centro Internacional de
Auto-Educação Vitalícia, fundado pelo biólogo Tomio Kikuchi, que trouxe a dieta
macrobiótica para o Brasil, existe dependência. Fique quinze dias sem comê-lo para ver , desafia ele, para quem pães e vegetais fornecem açúcares saudáveis. O açúcar branco
rouba nutrientes , diz. Claro, nem todos concordam com as idéias da macrobiótica e, nesse território, o açúcar tem sabor de polêmica.
William Dufty Recomendar doces para uma queda de glicose é um mau
conselho: fruta é melhor. Atacar sobremesas provoca uma carga de insulina que vai
passar o rodo no excesso de açúcar e causar nova fome de doces. Isso já é conhecido pela
medicina. Se você não quiser chamar isso de vício convenhamos que pelo menos é um
círculo vicioso. E a patologia do açúcar, suas ligações com cárie e outras doenças crônicas, não
é uma questão de acredite se quiser é científico. Apenas a ditadura do açúcar consegue
tumultuar o meio de campo confundindo a todos, inclusive médicos e nutricionistas, levando-os a acreditar que tudo trata-se de uma saborosa polêmica.
10. Pergunta de Yvone Galhardi, de São Roque, São Paulo. Existe algum açúcar
permitido para diabéticos?
Resposta da Revista: Estudos modernos sugerem que até o açúcar branco estaria
liberado , conta o diabetólogo Leão Zagury. Mas, no caso, só pequeníssimas quantidades
podem ser consumidas. E, ainda assim, sob a orientação do médico , lembra Antônio
Roberto Chacra, endocrinologista da Universidade Federal de São Paulo.
William Dufty Cara Ivone, se por açúcar você pensou no refinado, mascavo ou
demerara, a resposta é não. Cá entre nós, um troço que só pode ser consumido em
pequeníssimas quantidades e ainda assim sob orientação médica só pode ser um veneno, é melhor
cuspir. O mel de abelha, desde que não tenha sido adulterado com açúcar, pode ser
consumido com moderação. Há ainda os adoçantes não calóricos artificiais, e o natural
stévia, que têm sido consumidos pelos diabéticos.
Programas de saúde
O livro Programas de saúde, da dupla Gewandsznajder (diga Guevantsnaider) e
Vasconcellos, discorrendo sobre açúcares diz que a glicose e outros açúcares simples
raramente são encontrados livres na natureza. Eles estão em geral ligados a outros açúcares
simples, formando dissacarídeos e os polisacarídeos ; e o açúcar comum ou sacarose, por
exemplo, é formado pela união de duas moléculas de açúcares simples, a glicose e a
frutose .131
Do jeito que está redigido aí, mais parece merchandising de açúcar. Se glicose e
frutose encontram-se cada uma na sua e não ligadas, em todas as frutas e no mel, por que o
raramente ? Aliás, glicose e frutose é que são os verdadeiros açúcares preparados pela
natureza para consumo das plantas e também humano, tanto que não precisam de hidrólise
para serem assimilados - são fontes direta de energia. Já a sacarose não é fonte direta de
energia; é uma substância de reserva das plantas, reserva justamente de glicose e frutose. Note-se que a sacarose não se encontra normalmente em frutas maduras nem no mel; nos
dois casos sua presença é residual. Isso porque seu destino é justamente se converter nesses
dois açúcares.
As plantas, portanto, para poderem usar a sacarose necessitam primeiro que ela se
decomponha nos dois açúcares simples. No organismo humano a mesma coisa, a sacarose
tem que ser hidrolisada. No caso do açúcar refinado essa hidrólise e o metabolismo têm um
custo para o organismo: há um roubo de vitaminas, minerais e até oligoelementos.
O açúcar comum , portanto, não se encontra livre na natureza ; tem que ser
extraído, a duras penas, de plantas, mediante complexos processos físicos e químicos. A
sacarose refinada separada do meio natural de onde veio passa a ser um produto químico
nocivo ao ser humano. Esse produto químico só porque é doce conseguiu aboletar-se na
mesa da humanidade travestido de alimento, provoca um monte de doenças mas continua
soberano em seu reinado com a maior desfaçatez do mundo, debaixo do nariz de médicos, nutricionistas e químicos.
No capítulo referente às sugestões para a dieta do bebê, Programas de saúde
recomenda, para crianças com apenas 30 dias de nascidas, refresco de frutas com um
mínimo de açúcar e para bebês de oito meses, após as sopinhas, sobremesas de tudo o que
é porcaria açucarada: geléias, compotas, doces caseiros, pudim de leite etc.; e finalmente
para quem já tem dez meses de vida sugere-se biscoito de maizena à medida que ele
começa a mastigar bem.132 Deve ser para o bebê, depois de ganhar dentes, entrar para o
time dos desdentados logo cedo.
Já que mencionei Fernando Gewandsznajder, no livro Biologia hoje, escrito em
parceria com Sérgio Linhares, há uma recomendação contra o consumo de porcarias
açucaradas que transcrevo: Evite consumir em demasia balas, doces, chocolates, refrigerantes, chicletes e sorvetes. Apesar de serem muito ricos em calorias, esses alimentos
não possuem os demais nutrientes (vitaminas, proteínas, etc.) em quantidade adequada. Seu consumo excessivo diminui o apetite sem satisfazer as necessidades alimentares do
indivíduo, além de favorecer o aparecimento de cáries e obesidade . Meio confuso, meu
xará: no livro Programas de saúde um discurso favorável ao açúcar, e no de Biologia uma
recomendação contra o consumo excessivo de alimentos açucarados. Será porque os co- autores são diferentes?
Feita essa ressalva, acho a disciplina Programas de saúde da maior importância. Há
porém essa grave lacuna: falta um capítulo sobre os males do açúcar. No mínimo por
causa do problema das cáries dentárias e da obesidade infantil. E falta dizer que a solução
desses problemas é parar de comer açúcar e as porcarias açucaradas. Parar de vez, e não
apenas com o consumo excessivo .
131 Vasconcellos, JL & Gewandsznajder, F. Programas de saúde. Rio de Janeiro: Ática, 1991, p. 58. 132 Idem, p. 47.
Açúcar nos dicionários e enciclopédias
Nos anos 50 do século passado o advogado Fernando Levisky iniciou uma
campanha para expurgar dos dicionários brasileiros vocábulos com acepções pejorativas e
ofensivas à dignidade das pessoas. O Dr. Levsky era judeu e não se conformava com os
significados da palavra judeu e termos derivados constantes nos dicionários: Judeu - homem
mau, avarento, de má índole, usurário. Judiar - atormentar, escarnecer, maltratar os
outros. A campanha não se limitava a reabilitar o vocábulo judeu, pretendia escoimar de
significados pejorativos termos como negro, paulista, baiano, galego etc. A campanha do
Dr. Levisky teve repercussão e gerou o livro do jornalista Queirós Júnior, V ocábulos no
banco dos réus, encontrável nos bons sebos da cidade.
Nem o advogado nem o jornalista pensaram nisso mas a palavra açúcar está mal
definida na maioria dos dicionários da língua portuguesa que classifica açúcar como sendo
um alimento. Desde o pioneiro Dicionário da Língua Portuguesa de Antonio de Moraes e
Silva do final do século dezoito.
O dicionário mais entusiasta em relação ao açúcar é o Lelo, editado em Portugal. Segundo este prestigioso dicionário, reeditado até hoje, o açúcar é uma substância doce e
agradável ao paladar que se extrai de certos vegetais e, arremata mais adiante, é um
alimento de primeira ordem . Outro não menos entusiasta é o brasileiro Koogan Houaiss, cujo verbete deve ter sido redigido nos escritórios dos fabricantes de açúcar: Alimento de
sabor doce que se extrai da cana-de-açúcar e da beterraba e, mais adiante, purificado, filtrado, cristalizado, é consumido após a refinação que o torna mais puro ainda . Laudelino Freire surge como uma exceção à regra com ele a conversa é outra. Firme, o insigne dicionarista recusa-se a chamar açúcar de alimento: corpo doce , substância doce , qualquer coisa menos alimento. O Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa é perfeito: Açúcar, nome vulgar
da sacarose . Sacarose, por sua vez é assunto para químico. O curioso é que Aurélio
Buarque de Holanda Ferreira ganhou fama como organizador desse dicionário que fora
iniciado várias edições antes por Hildebrando Lima e Gustavo Barroso. Já famoso, Aurélio
lançou um dicionário novo ao qual pespegou seu próprio nome. Comparando com o
Pequeno Dicionário que o antecedeu, pelo menos no que diz respeito ao açúcar, o Aurélio
mudou para pior. Por incrível que pareça, o badalado Aurélio define o açúcar como
alimento . E finalmente para provar que tamanho não é documento o grandissíssimo
Houaiss também arrola o açúcar como alimento.
Pulando de dicionário para enciclopédia, a popularíssima Enciclopédia Barsa inicia o
verbete açúcar definindo-o como substância destinada a adoçar bebidas e alimentos . Só
tenho a dizer que em minha casa o açúcar destina-se à lata de lixo, com açucareiro e tudo.
Já a igualmente popular Delta Larousse começa assim: Alimento cristalizado de
sabor doce e ao falar dos usos do açúcar começa pelo seu papel na alimentação, onde
figuraria como excelente produtor de energia , o qual, parte indispensável de uma dieta
bem balanceada, fornece um alto valor energético por unidade de peso . A Delta, infelizmente, com esse comentário induz o leitor a erro. Por dieta balanceada ou
equilibrada entende-se a famosa dieta constituída de carboidratos, gorduras e proteínas, distribuídos na igualmente famosa pirâmide. Como todos os alimentos destas três
categorias além de nutrir fornecem energia suficiente ao bom funcionamento do
organismo, o açúcar surge como um aditivo químico fornecedor apenas de calorias
desnecessárias e gosto doce; não acrescenta nenhum nutriente. Sua adição aos alimentos vai
contribuir para tornar a dieta artificialmente hipercalórica. Em outras palavras, uma ração
desequilibrada.
Sem querer ensinar padre a rezar missa, gostaria de lembrar a nossos lexicógrafos
que definir açúcar como alimento é um caso de falsidade ideológica. Açúcar por definição
é apenas um aditivo químico que se adiciona aos alimentos por causa de seu gosto doce. Tal costume porém terá que ser colocado em xeque devido às suas conseqüências
patológicas.
Inserir figura gordo
William Duffty no tempo em que comia
açúcar. Parecia o Paulo Francis.
Inserir figura magro
William Duffty depois que parou de
comer açúcar. Ficou parecido com um James
Dean mais maduro.
A partir dos anos 60 tenho vivido sem o açúcar, desde então tenho estado longe
dos médicos, dos hospitais, das pílulas e injeções . (William Duffty).
Velocidade de absorção dos diferentes açúcares
Galactose 1,1
Glicose 1,0
Frutose 0,4
Manose 0,2
Xilose 0,15
Arabinose 0,1
PoderEdulcorante dos Açúcares
Frutose 170
Sacarose 100
Glicose 50
Lactose 20
Estatísticas da Dinamarca
Consumo Anual de Açúcar Mortes Causadas por Diabetes
1880 14,5 Kg de Açúcar 1,8 morte a cada 100 mil
1911 41 Kg de Açúcar 8 mortes a cada 100 mil
1934 57 Kg de Açúcar 18 mortes a cada 100 mil
Estatísticas como esse fragmento aí são difíceis de se encontrar. William Dufty em
Sugar blues usou estatísticas dinamarquesas porque os próprios Estados Unidos são
deficientes delas.
RESISTÊNCIA À DITADURA
Num futuro próximo, a coerência humana, baseada em fatos e observações científicas, vai vencer o poder
econômico e o açúcar será proibido por lei.
Dr. Paulo Timóteo Fonseca
O açúcar não invadiu a mesa da humanidade sem resistência. Tão logo chegou e
começou o seu trabalho de destruição dos dentes e do metabolismo do ser humano, vozes
se levantaram para denunciar. O que mais impressiona é a antigüidade de alguns
depoimentos apesar da precariedade dos conhecimentos da época. Estamos falando de
boticários e alquimistas, é impressionante a precisão de alguns diagnósticos. Não foi
preciso entrar em cena o açúcar colonial nem a massificação do consumo, que só veio a
acontecer em meados do século XVII. O fim da Idade média presenciou uma queda
drástica dos preços do açúcar. E o açúcar proveniente de velhos centros produtores
(Chipre, Beirute, Sicília) e mais o das Ilhas Canárias e da Madeira que abasteciam a Europa
a partir de 1450, já foi o suficiente para dizer à humanidade a que ele veio.
O coro dos que denuniciavam o estrago que o açúcar estava causando ao ser
humano praticamente acompanhou o advento e a expansão do império do açúcar. O
historiador alemão Edmund von Lippmann assim se referiu a essas vozes: Uns diziam que
esquentava, outros, que atacava o peito, outros ainda, que causava ataques de apoplexia . A seguir um apanhado desses nossos pioneiros heróis da resistência.
Ainda segundo Lippmann, em 1543 o botânico Ruelle, autor de Natureza das plantas, escreveu: O açúcar é hoje tão comum e indispensável às simples refeições, que muitos já o
repelem e consideram prejudicial, sobretudo às crianças, nas quais provoca vermes . Porta
(1539-1615) considerava o açúcar produtor de bile, e Van Helmont (1578-1644): O açúcar
é sempre inútil, às vezes prejudicial, principalmente a certos órgãos como o estômago e o
útero. Além disso, mediante a clarificação com leite de cal e argila, absorve um sal alcalino, que decompõe os ácidos eficientes do estômago, perturba a digestão, provoca forte
fermentação, aumenta a secreção de bile e, assim, deteriora o sangue . Boyle (1626-1691) e
Kunckel (1630-1703) julgavam-no nocivo por ser fermentável e agente de fermentação, ambos concordavam que provocava a fermentação da digestão e dava lugar a numerosas
doenças do estômago. Tavernier (já citado) disse em 1634: Quem comer açúcar durante
trinta anos envenena-se com certeza ; E Garenzieres em 1647: O açúcar não é alimento, mas veneno, e o melhor seria devolvê-lo para a Índia, pois só assim seria possível vencer a
tuberculose que sua ingestão demasiada traz consigo . Para Willis, o açúcar ataca os tecidos
e causa feridas malignas, para Pauli esquenta o corpo e ataca os pulmões; para Ray provoca
o apodrecimento por neutralizar os princípios amargos que sustentam e conservam o
corpo, e, segundo Lémery (1697), ataca a mucosa da boca e estraga os dentes. Hoffmann
diz (1701-1703) que ele, pela purificação a cal, se torna acre e quente, e contém, além disso,
um certo ácido combinado com um sal e um espírito combustível; Herrmann, é de opinião
de que ele irrita as gengivas, a abóbada palatina e os pulmões; o autor de Institutes of health é
totalmente contrário ao açúcar. E Brun salienta a nocividade da cal.133
A essa lista podemos acrescentar o médico naturalista bitânico James Hurt, citado
no capítulo introdutório. E ainda um cronista citado por Lippmann chamado Hentzner que
em sua Descrição de viagem diz: Seus dentes são escuros, falha de que muitos ingleses
parecem sofrer, porque comem muito açúcar. E o põem em grande quantidade nas
bebidas .Na internet tomei conhecimento da existência do livro Secret relationship between
blacks and jews, de Tony Martin, que segundo depoimentos descreve os esforços de vários
monarcas europeus para barrar o avanço do consumo de açúcar, tabaco e rum. Mas o que
é um monarca europeu ante a sólida aliança de banqueiros e traficantes de açúcar e
escravos?
A bandeira da resistência ao avanço da ditadura do açúcar, durante o século XIX, continuou nas mãos setores médicos não convencionais. A família desses médicos
alternativos é grande e conta com representantes em diversos países. Luis Kuhne e Ludwig
Walb na Alemanha; Herbert Shelton e seu seguidor o Dr. Hay nos Estados Unidos; Are
Waerland na Suécia; Luciano Pecchiai na Itália; Desiré Merién na França; Georges Ohsawa
do Japão etc. Depois que os males do açúcar passaram a dar na vista médicos
convencionais entraram na luta: Yudkin, Cleaver, Atkins, McCully, Appleton são exemplos. É impressionante também o fato de que a maioria desses médicos alternativos condenava o
consumo de açúcar quando ele ainda era considerado um tempero . Hoje o aditivo
químico foi guindado ao patamar de produto de consumo de massas, talvez o primeiro da
lista. A seguir alguns capítulos dessa luta que no Brasil conta com um mártir recente. Falaremos dele.
A ditadura do pacote tecnológico do açúcar e a indústria da doença são colunas de
sustentação do regime capitalista. Acontece que chegamos àquela famosa situação na qual a
legião de desdentados, obesos, diabéticos, hipertensos, cardíacos etc. representa gastos com
saúde pública maiores que os ganhos com os lucros obtidos pela produção de açúcar.
Sugar blues
Não poderia deixar de destacar aqui o livro Sugar blues, um ícone da resistência à
ditadura do açúcar. Nele fala-se em indústria da doença pela primeira vez e fabricante de
açúcar é tratado como traficante de açúcar. Seu autor, William Dufty, jornalista e biógrafo
de Billie Holiday, era um americano típico, isto é, um sanpaku. Seus olhos, segundo ele
mesmo, pareciam dois ovos fritos. Quem abriu seus olhos quanto ao açúcar foi Glória
Swanson, estrela de Hollywood dos anos 20, com quem ele veio a se casar. Glória dizia
que a porcaria do açúcar não entrava nem em sua casa, quanto mais em seu corpo. Gostaria
133 Lippmann, E. Op. cit.,p. 187.
de ler uma biografia dessa mulher para saber como ela tomou consciência do que é o
açúcar.
O casamento dos dois foi feliz enquanto durou. O fim do idílio terminou em
processo e Glória colocou William temporariamente na cadeia certamente por causa de
atraso no pagamento de pensão.
Preso, Dufty conseguiu com a direção do presídio permissão para receber bolinhos
de arroz integral, e com isso ficou livre da dieta açucarada, servida aos presidiários, a qual
engorda o ser humano, deixa-o flácido e com pensamentos homicidas ou suicidas.
William Dufty contribuiu para divulgar a macrobiótica no Ocidente traduzindo os
livros de Georges Ohsawa para o inglês. A obra principal de Dufty, Sugar blues deve ter sido
traduzida para muitas línguas e deve ter feito muita gente parar de comer açúcar. Se bem
que conheci um sujeito que me disse que parou de ler Sugar blues pela metade porque
quando lia sentia vontade de comer doce. E Sônia Hirsch menciona outro que evitou ler
para não ficar com a consciência culpada ao comer doces. É um livro, como dizer?, seminal. Anda meio esquecido, e agentes da ditadura do açúcar já o consideravam um
cachorro morto quando, quase trinta anos depois, o livro inspira outro que dá continuidade
à sua luta.
O fator homocisteína
A alimentação do ser humano tornou-se fonte de doenças desde que foi tomada de
assalto pelo açúcar. Antes dele os alimentos eram fonte de saúde. Esse fato tem que ser
ocultado. Da ocultação dessa verdade depende a manutenção de um sistema terrível que se
sustenta mutuamente de alimentos e medicamentos, como disse o doutor Atkins. É a indústria da
doença que movimenta bilhões de dólares.
A indústria da doença tem realizado os mais ingentes esforços com esse objetivo. Seu feito de maior sucesso foi quando elegeram a gordura e o colesterol como bodes
expiatórios da dieta moderna. Combinado com o uso da teoria das calorias e a prática de
acusar inocentes vítimas da dieta açucarada de maus hábitos alimentares e estilo de vida pouco
saudável. Com esse pacote teórico e prático a indústria da doença conseguiu atravessar todo
o século XX.
Pela altura de 1930 os médicos, desprezando as teorias metabólicas, fixavam-se
nos hábitos alimentares defeituosos. E aqui entraram em cena as calorias. Recebesse o
corpo mais calorias, acreditavam esses médicos, e as calorias extras se converteriam em
gordura. Muitos ainda se apegam a essa crença. Teorias médicas enraizadas, ainda que
errôneas, tardam muito a desaparecer . 134
Com essas palavras o Dr. Herman Taller, autor do livro Calorias não engordam, descreveu esse momento crítico de inflexão no discurso da indústria da doença.
Mas a marcha da indústria da doença encontrou alguns obstáculos pela frente. Um
deles, talvez o principal, foi o Dr. Kilmer McCully, autor do livro O fator homocisteína. Ele
descobriu que o colesterol não é causador de doenças cardiovasculares, e que fazer dietas
pobres em colesterol é perda de tempo porque o colesterol é um nutriente essencial o
organismo humano, na ausência de colesterol na dieta, produz ele mesmo o colesterol que
é necessário na produção de células novas. E que o causador de doenças do coração
134 Taller, Herman. Op. cit., p. 29.
chama-se homocisteína. A homocisteína, como explica o doutor Sérgio Puppin, é um
produto intermediário do metabolismo da metionina, um aminoácido essencial.135 Segundo
o Dr. McCully, o aumento de homocisteína é conseqüência do baixo consumo de
vitaminas do complexo B e ácido fólico devido à dieta rica em carboidratos refinados.
Um médico que diz que as pessoas estão doentes por causa do que comem (a dieta
açucarada moderna) e que a cura é uma alimentação rica em vegetais integrais, carnes
frescas e a supressão de carboidratos refinados, dentre eles o mais refinado e puro, o açúcar - de um médico desses é tudo que a indústria da doença não precisa.
Por causa de suas idéias o Dr. McCully foi perseguido, perdeu emprego e verbas
para pesquisas e até recebeu trotes venenosos ao telefone. Ele se viu obrigado a contratar
um bom advogado para defender seus direitos.
Apesar disso o lobby do colesterol, ou melhor, do açúcar, continua no poder, vide a
guerra que eles travam com o Dr. Atkins, a outra pedra no mocassim da indústria da
doença do qual falaremos a seguir.
A dieta revolucionária
O Dr. Robert Atkins é o criador da famosa e polêmica dieta tida como rica em
gorduras e pobre em carboidratos, embora o famoso médico inglês Dr. John Yudkin tenha
comparado e concluído que quem faz dieta cetogênica-lipolítica no final das contas ingere
menos gordura do que na dieta dita balanceada, na qual prevalecem carboidratos. Isso pela
simples razão de que a gordura sacia a fome muito mais que carboidratos.
A dieta Atkins em linhas gerais consiste em uma semana baseada só em carnes e
saladas, com supressão completa de cereais naturais ou refinados e redução de frutas. Depois que o obeso entra no metabolismo cetótico-lipolítico que ele chama de CDB, Cetose Dietética Benigna, e perde gorduras até o ponto desejado, começa-se a reintroduzir
os carboidratos na dieta (os naturais, bem entendido), desde que não provoquem um novo
processo de engorda; caso isso aconteça torna-se a cortá-los.
Visando combater a obesidade o Dr. Robert Atkins, através de sua dieta, teve uma
agradável surpresa: seus pacientes além de perderem peso foram se vendo livres de doenças
crônicas como hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, artrose etc. Eles
começaram a se recuperar de doenças que eu nem desconfiava que ia tratar dessa maneira
136, disse o doutor.
Em medicina existe o conceito de iatrogenia; para o que aconteceu com Atkins
sugiro o neologismo euiatrogenia, a iatrogenia do bem.
Uma crítica que se pode fazer a Atkins é que ele diaboliza um pouco os
carboidratos em geral por causa dos refinados. Os carboidratos naturais nada têm a ver
com isso
É claro que carboidratos refinados (trigo, arroz e milho brancos) provocam prisão
de ventre, engordam e desnutrem por deficiência de vitaminas e fibras.
Por que o Dr. Atkins é uma espécie de ovelha negra para a comunidade médica
americana e mundial? É porque Atkins reabilitou a gordura, um alimento básico da
humanidade há milhões de anos, usada como bode expiatório pela indústria da doença para
135 Puppin, S. Doenças cardiovasculares:verdades e mitos. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 2003, p. 97. 136 Atkins,Robert C. Op. cit., 2001, p. 30.
desviar a atenção do açúcar um veneno introduzido na mesa da humanidade há pouco mais
de cinco séculos. É porque ele elegeu como o responsável pela epidemia de obesidade nos
EUA adivinhem quem? Se eu tivesse que escolher um único fator causador - o maior
responsável - da epidemia de obesidade que se espalhou em todos os países
ocidentalizados, este seria o consumo excessivo de açúcar refinado . É porque ele
desmascarou o açúcar, o carboidrato assassino como ele o chamava, responsável pelo
envenenamento por carboidratos . E viu como funcionava a indústria da doença; a esse
conceito que Dufty lançou em Sugar blues, Atkins deu conteúdo: que é a indústria da doença
se não aquela cultura industrial que se sustenta mutuamente, de alimentos e
medicamentos ?
Claro que as agências da ditadura do açúcar e a máfia de branco não o perdoam
por isso e o perseguem mesmo depois de morto. A mídia do mundo inteiro espalhou a
calúnia de que ele teria morrido obeso . O jornal O Globo informou, em 21 de
novembro de 2003, que um certo Comitê de Médicos Para Uma Medicina Responsável
acusa a dieta do doutor Atkins pela morte de uma senhora e uma adolescente.
O primeiro livro do Dr. Atkins é de 1972; sua dieta já é praticada há mais de trinta
anos. Se estivesse matando gente, a tropa de choque do açúcar já teria caído de pau em
cima dele há muito mais tempo.
O episódio Waerland
Na segunda metade do século XIX os médicos alternativos já ministravam
tratamentos eficazes para o diabetes.
O ponto de partida era a eliminação do açúcar da dieta, isso combinado com o uso
de produtos naturais, cereais integrais e frutas frescas. O sistema nutricional de Are
Waerland, que depois da sua morte foi continuado por sua mulher Ebba, teve origem no
final do século XIX e baseia-se no uso de alimentos crus (crudivorismo). Utiliza o jejum, recomenda o uso de chá de vagem no lugar da insulina e, o mais importante, coloca os
alimentos que contenham açúcar no rol dos alimentos proibidos.
A terapêutica Waerland lograva eliminar o problema das altas taxas de glicose no
sangue. Os médicos a serviço da indústria da doença argumentavam que isto não
significava a cura da doença. Segundo eles, bastava que o paciente voltasse à alimentação
comum (leia-se dieta açucarada) para que os níveis de açúcar voltassem a subir. Dona
Ebba retorquia que se um diabético consegue, com uma alimentação de valor integral, que
o açúcar lhe desapareça do sangue e da urina, e seu estado geral melhore cada vez mais, não
parecerá absurdo continuar a considerá-lo doente? E Dona Ebba ia mais longe: E não se
poderá dizer, com todo o direito, que a doença foi curada? É natural que as glândulas
produtoras de insulina acusem, ainda por algum tempo, certa fraqueza orgânica. Finalmente, não me parece sinal de doença que não suportem uma alimentação artificial
nociva à saúde . 137
Desde o século XIX que os médicos naturalistas percebem a brincadeira: submete- se toda a população a uma dieta açucarada e os mais fracos caem diabéticos. A cura é
simples: basta tirar o açúcar da dieta. E se essa medida for adotada como prática
preventiva generalizada a toda a população, em breve não haverá mais diabéticos na face da
137 Waerland, E. Terapêutica de Waerland. Rio de Janeiro: Germinal, 1968, p. 76.
Terra. A ditadura do açúcar conseguiu concretizar o sonho de Joseph Goebels: a dieta
adulterada pelo açúcar passa como alimentação normal, exige-se das pessoas tolerância ao
veneno de rato (leia-se açúcar) e quem não agüenta a dieta açucarada é porque é doente
(diabético).
Herbert M. Shelton
De acordo com o higienista norte americano Herbert M. Shelton, autor de Food
combining made easy, o açúcar não combina com nenhum alimento. O açúcar, segundo ele, inibe a secreção do suco gástrico e a própria motilidade do estômago.
O alimento protéico associado ao açúcar tende à putrefação com a formação de
ácido sulfídrico, ptomaínas, leucomaínas, fenóis, escatol, indol, etc. - terríveis venenos , nas palavras do ilustre higienista.
Com o amido, a mesma coisa: como o açúcar tende rapidamente à fermentação nas
condições de calor e umidade existentes no estômago, a combinação de amido e açúcar
produz fermentação, formando ácido acético, álcool e gás carbônico.
O tema do livro do Dr. Shelton é combinação de alimentos, de modo que falar em
açúcar, um aditivo químico, combinado com carboidratos, gorduras ou proteínas, não é de
bom alvitre. Trata-se do comportamento de alimentos na presença de um aditivo químico.
Nossos cientistas pesquisadores estão nos devendo o resultado dos efeitos físicos e
bioquímicos do açúcar nos processos digestivo e metabólico.
Fordismo nutricional
O legendário Henry Ford, da indústria automobilística americana, fundou em 1928
uma escola vocacional para ensinar meninos carentes a trabalhar com as mãos e a
pensar , certamente com a cabeça. Em turno integral, meninos de doze a dezessete anos
eram matriculados da nona à décima segunda séries. A Wayside Inn , esse era o nome da
escola, além do currículo normal ministrava ensino profissionalizante em agricultura, engenharia elétrica e mecânica, encanamento, carpintaria, etc.
Ford aproveitou para por em prática na escola sua filosofia nutricional. Baseada na
combinação de alimentos, amidos e proteínas nunca eram servidos juntos porque eram
considerados quimicamente incompatíveis. Já saladas de verduras eram servidas duas vezes
ao dia. Agora o mais importante: Proibia-se o açúcar, balas, bolos, tortas, pudins e outros
tipos de sobremesas doces .138 Proibiam-se também os transportadores de açúcar: chás e
chocolates e até o sal.
Alimentação dissociada do Dr. Howard Hay
Um outro exemplo de resistência ao avanço da ditadura do açúcar é o movimento
inaugurado pelo Dr. W. Howard Hay, autor do livro A new health era. Seu regime alimentar
138 Essa história contada em artigo da revista Early American Life está citada em Dieta sem fome, do casal
Diamond. Rio de Janeiro: Record, l999, p. 66.
era chamado de alimentação dissociada. O livro do Dr. Hay, em 1939, impressionou
vivamente o médico alemão Ludwig Walb: ele e sua esposa Ilse Walb divulgaram com
muito sucesso na Alemanha a dieta do médico americano.
Fundamentalmente a alimentação dissociada propõe a separação numa mesma
refeição entre alimentos protéicos (carnes) e carboidratos (cereais refinados). Essas
categorias de alimentos devem ser consumidas uma de cada vez, juntamente com verduras, legumes e frutas, de preferência crus.
O regime é prevalentemente vegetariano e propõe 90% de cereais, verduras, legumes e frutas e 10% apenas para carnes.
O Dr. Hay levava em consideração os conhecimentos da ciência química da época. Havia uma preocupação com o equilíbrio ácido-base do organismo. Sua dieta também
tinha suas idiossincrasias e recomendava que se comesse só um tipo de amido ou só um
tipo de proteína - nunca misturar dois numa mesma refeição.
O Dr. Howard Hay era um sábio: ele dizia que o único tratamento verdadeiro de
todas as doenças é evitar suas causas.
O açúcar era considerado por ele um alimento desnaturado, assim como pão
branco, macarrão de farinha branca e arroz branco. Esses alimentos são acidificantes no
mais alto grau porque sua combustão deposita ácido carbônico no sangue, seu perigo
essencial resulta do fato de que eles não depositam suficientemente elementos alcalinos no
corpo humano, ocasionando assim o estado acídico
139, afirmava o Dr. Hay.
Os Adventistas do Sétimo Dia
Desde o século XIX a igreja dos Adventistas do Sétimo Dia, nos Estados Unidos, preocupa-se com a saúde dos seus fiéis e faz-lhes recomendações quanto ao estilo de vida e
nutrição. A igreja tem mesmo um programa de completo de saúde, com instruções quanto
a o que comer, como preparar os alimentos, vida ao ar livre, exercícios etc.
Como não podia deixar de ser, a universidade americana já pesquisou e comparou o
grupo dos adventistas com a população em geral.
Por exemplo, para cada 100 americanos comedores de açúcar, que morrem de
diabetes, o mesmo só acontece com 55 dos adventistas.
O programa dos adventistas inclui advertências quanto ao álcool, café, fumo e
drogas. Eles são também contra a carne, estão mais para vegetarianos.
Fumo, álcool e drogas são rigorosamente proibidos pelos adventistas.
Quanto ao que interessa aqui, o açúcar, é de 1870 a seguinte recomendação
adventista: O açúcar abarrota o organismo. Entrava o trabalho da máquina viva .´140
Isso quando o consumo de açúcar, por lá, era de 15 quilos por pessoa a cada ano. Hoje cada americano consome, por ano, mais de 80 quilos de açúcar. Ainda hoje os
adventistas recomendam diminuir o uso do açúcar para o mínimo possível. Embora eles
admitam que algum açúcar é útil no preparo de enlatados e na preservação de alimentos, bem como para tornar certos pratos apetitosos. Nem se condena o açúcar numa sobremesa
139 Hay,W. H. & Walb, L. A alimentação dissociada. Heildelberg: Karl F Verlag, 1983, p. 28. 140 Walton, Lewis et alii. Seis anos a mais. São Paulo: IAES/IASD, 1988, pág. 14.
ocasional, desde que ingerida em quantidade moderada. Mas como regra geral, o adventista
que se preocupa seriamente com a reforma da saúde esforçar-se-á para remover tanto
quanto possível o açúcar da dieta . É isso aí: a fé remove a montanha de açúcar.
Os naturalistas
Naturalismo é um conceito um tanto vago. Naturalista, em princípio, seria aquela
pessoa que procura viver em harmonia com a natureza e evita alimentos industrializados, cheios de produtos químicos. Naturalistas são os macrobióticos, os vegetarianos, os
esotéricos... Não existe uma doutrina naturalista, eles se baseiam mais na intuição. Diante
do açúcar os naturalistas de se dividem: a maioria é adepta do açúcar mascavo, produto não
refinado industrialmente. Mas tem gente que não vê grande problema em ingerir açúcar
branco desde que seja com equilíbrio . Ora, qualquer colher de chá de açúcar provoca
dano, logo a única filosofia equilibrista em relação ao açúcar é tolerância zero. Um médico do século XIX estava melhor informado que seus colegas de hoje em
dia. O doutor Amílcar de Souza em seu livro A saúde pelo naturismo já dizia: Açúcar é um
alimento morto. É um corpo químico perigoso. Não passa de um triçoeiro pó branqueado. O açúcar é causa de perturbações digestivas variadas, de doenças da nutrição como o
diabetes, do nervosismo e, além disso, formador não de bons ossos, mas de péssimos
dentes . No geral a filosofia naturalista é louvável; o único defeito dela é que não enxerga
que o açúcar nada tem de natural.
A maior prova de que a maioria os naturalistas contemporâneos não têm
problemas com o açúcar é o fato de toda loja de venda de produtos naturais ter balcão de
lanches no qual pode-se beber guaraná natural , mate natural , acerola com laranja , tudo devidamente adoçado com açúcar refinado. Exemplo claro de que os naturalistas
estão enganados em relação ao açúcar está no livro Unidade da vida, manual de agricultura
natural, de Edson Hiroshi. Nele encontrei uma receita de cerveja natural . O autor
recomenda a adição de meio quilo de açúcar para que a cerveja não fique amarga . Com
certeza os naturalistas não sabem o que é açúcar e muito menos o que é cerveja. Pela
internet fiquei sabendo que o único país do mundo que proibe a adição de açúcar na cerveja
é a Alemanha. Vejam a ironia da coisa: os industrializadíssimos alemães fabricam cerveja
natural de verdade, isto é, cerveja sem açúcar.
A postura que se espera de quem se pretende naturalista, em relação ao açúcar, repito, é tolerância zero, posto que não estamos diante de um produto natural e sim de um
agente adoçante e conservante químico. O açúcar nadando no caldo de cana é um produto
natural. Isolado por processos químicos e físicos, deixa de ser. Para mim, a complacência
dos naturalistas para com o açúcar deve-se ao fato de sua origem vegetal. Se ao invés do
açúcar do açucareiro fosse a lactose (açúcar do leite) com certeza apareceria naturalista
reclamando do produto por causa de sua origem animal .
O professor Alfons Balbach, autor do livro As hortaliças na medicina doméstica, é mais
um caso de naturalista que acha que açúcar é natural só porque vem da cana e da beterraba.
Entre os açúcares se destaca a sacarose , a maior fonte de carboidratos , segundo a
opinião entusiasmada de Balbach. No livro o açúcar mereceu uma ilustração de página
inteira mostrando um cortador de cana, um pote de melaço e um saco de açúcar. Em outra
página há um gráfico sobre o teor glicídico de vários alimentos vegetais . Açúcar de
primeira em primeiro lugar. Foi por causa de naturalistas como Balbach que eu comi
açúcar a vida inteira como um perfeito basbaque.
Para finalizar o capítulo dos naturalistas, o besteirol mais recente é o tal do açúcar
orgânico . O açúcar só pode ser orgânico até o meio do caminho de seu processo de fabricação.
É possível a existência de um canavial orgânico, no qual não se use agrotóxico. Mas, e no
momento de separar a sacarose do resto da cana? Não vão usar dióxido de enxofre, nem
cal, nem produtos químicos branqueadores? E o açúcar final, que grau de pureza terá? E o
que não é sacarose é o quê? Não há resíduos químicos? Nem metais pesados? E a sacarose
orgânica, que diabo é isso? Ela por acaso não é cariogênica como a refinada? Nem induz o
pâncreas a produzir excesso de insulina? Essas considerações todas valem também para o
açúcar mascavo e suas sujidades, o xodó dos naturalistas.
Açúcar orgânico é mais um caso de falsidade ideológica com a agravante de tentar
enganar um povo de boa fé que é o naturalista. Naturebas de todos os países, abri vossos
olhos!
Os macrobióticos
Os seguidores de Georges Ohsawa ou Sakurozawa Nyoiti parecem saber o real
significado de açúcar. Mas na verdade os macrobióticos padecem do mesmo mal que os
naturalistas: iludem-se quanto ao açúcar mascavo consumido por eles. Não enxergam que o
mascavo é tão cariogênico e hiperinsulinogênico quanto o refinado, com a desvantagem de
conter sujidades.
Os macrô colocam o açúcar do açucareiro no mesmo saco do mel e das frutas. Essa
filosofia nutricional endeusa o arroz integral e faz restrições às frutas, ao mel e até à água e
ao leite. Para eles o açúcar é tão ruim quanto o mel, ou melhor, pelo menos um expoente
dessa doutrina é até mais simpático ao açúcar: Nada consta a favor do açúcar, exceto o
fato de ele ser muito doce e gostoso . Enquanto o mel é um ótimo alimento... para as
abelhas (...) mas quanto aos efeitos no corpo humano podemos compará-los aos do
açúcar 141
. Os macrobióticos costumam dizer que o açúcar para ser metabolizado vai roubar
cálcio do nosso organismo, cálcio este que vai fazer falta aos nossos dentes e ossos. Sabem
também que o açúcar faz mal ao fígado, cuja capacidade é limitada, e que a dieta açucarada
provoca uma expansão hepática, deixando o fígado dolorido.
A macrobiótica é originária do Japão, país de clima temperado, onde no inverno cai
neve. Nesse país as frutas e a água talvez não tenham a importância que têm em países
tropicais. A macrobiótica precisa se aclimatar aos trópicos, onde água e frutas são de
importância vital.
141 Kushi, Michio et alii. Seminário: medicina, filosofia e cultura oriental, 21 a 27/11/1977, p. 27.
Finalmente os macrobióticos, assim como seus colegas naturalistas, precisam abrir
os olhos e fazer a distinção entre um produto extraído de um capim por meio de processos
industriais, nocivo à saúde, e os açúcares naturais das frutas e do mel que só fazem bem.
Os macrobióticos foram aqui alinhados nas fileiras da resistência à ditadura do
açúcar como guerreiros aloprados, desses que atiram no que vêem e acertam no que não
vêem.
Alimentos ácidos e alcalinos
Peter Sorensen é o nome do químico dinamarquês que em 1909 criou uma escala
para indicar o grau de acidez ou alcalinidade de um meio ou de uma substância. Essa
escala, denominada de pH, vai de 0 (acidez máxima) a 14 (máxima alcalinidade). Sete, valor neutro, é o pH da água. Cada grau equivale a uma reação decuplicada: um pH 5 é dez
vezes mais ácido que um pH 6. Todos os alimentos em estado natural possuem cada qual
seu pH. O limão, por exemplo, é ácido. A água, como já vimos, é neutra. Frutas, verduras
e legumes em geral são alcalinos.
O organismo humano funciona à base de um delicado equilíbrio de condições
ácidas e alcalinas. O pH dos diversos segmentos do tubo digestivo age de maneira decisiva
sobre a digestão. A digestão gástrica das proteínas requer um meio ácido que é assegurado
pela secreção clorídrica desse órgão. Carboidratos amiláceos, por sua vez, necessitam de
um ambiente fracamente alcalino. O duodeno metaboliza o quimo intestinal em meio
alcalino preparado pela bile, e assim por diante .
Nesse sentido não importa o pH de um alimento em seu estado natural e sim as
transformações químicas por que ele passa no processo digestivo em contato com enzimas
e com o suco gástrico, cuja composição varia de acordo com o tipo de alimento. O limão, por exemplo, que em si é ácido, quando no estômago torna-se alcalino. O leite, que é
alcalino, no estômago assume uma função ácida.
Hoje a nutrologia e a bioquímica conhecem com boa margem de segurança a
digestão, assimilação e metabolismo dos alimentos. Mas desde a Antigüidade o homem se
preocupa com a combinação de alimentos. A Bíblia, por exemplo, não recomenda a
ingestão de carne e leite na mesma refeição. A alemã Gudrun Ritzerfeld Dalla Via, autora
do livro Las combinaciones alimentícias, é continuadora de uma escola naturalista voltada para a
combinação dos alimentos. Representantes dessa filosofia em vários países são Herbert
Shelton e Howard Hay nos Estados Unidos, Desiré Mérien na França, e Dr. Ludwig Walb
na Alemanha. Até Pavlov na URSS escreveu sobre o assunto. Tal escola preconiza, para
que se tenha boa saúde, entre 70 e 80% de prevalência alcalina na alimentação. Os
restantes 20 a 30%, claro, de alimentos ácidos. O açúcar, substância doce na boca, no estômago provoca uma reação massiva dos
sucos gástricos gerando hiperacidez, a qual provoca desde gastrites a úlceras estomacais. De modo que a alimentação açucarada do homem moderno vai de encontro a toda essa
tradição que defende uma dieta prevalentemente alcalina.
Segundo o Dr. Rui Coutinho, o uso excessivo de açúcar pode ter efeito irritante
sobre os tecidos de revestimento do canal alimentar 142
. E a autora citada, Dona Dalla Via, acrescenta: Uma acidez persistente e excessiva pode provocar uma série de transtornos. Um grande número de enfermidades agudas ou crônicas é atribuído à hiperacidez do
142 Coutinho, Ruy. Noções de fisiologia da nutrição. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1981, p. 138.
sangue, desde a acetonemia e desvio da coluna vertebral em crianças até reumatismo e
disfunções metabólicas várias 143
. É bem verdade que o organismo humano possui sistemas
tampões (acido carbônico, bicarbonato de sódio etc.) para proteger o sangue de oscilações
drásticas do pH (acidose ou alcalose), de sérias conseqüências para a saúde.
A hiperacidez provocada pelo açúcar descalcifica porque para manter o pH do
sangue o organismo mobiliza sais alcalinos da reserva mineral do corpo. Alguns estudos
revelam que uma colher de chá de açúcar rouba minerais do organismo durante três horas
seguidas, descalcificando ossos, dentes e sistema nervoso.
Acontece que a dieta açucarada, o pão nosso de cada dia, tende a minar o equilíbrio
ácido-base do organismo fundamentada no princípio de que água mole em pedra dura
tanto bate até que fura.
A solução radical do problema implica fechar a torneira do açúcar. A medicina
tende a gostar de soluções tipo passar uma resina impermeabilizante na pedra para que não
seja furada pela água .
Nós, do movimento Açúcar zero, diante de mais essa virtude açucareira, a de
contribuir para acidificar a digestão e, o que é pior, o pH sangüíneo, somos taxativos: jogue
fora o açúcar de sua mesa com açucareiro e tudo e diga adeus à azia, à má digestão e a
coisas piores.
Gaúchos derrotam a ditadura do açúcar
Durante a guerra fria era muito comum a preocupação com a expansão do
comunismo. Era preciso conter o avanço do comunismo no mundo. Pois bem, com mais
força do que o comunismo o açúcar tem-se expandido no sentido de impregnar totalmente
tudo o que entra pela boca da raça humana.
O avanço da ditadura do açúcar não respeita nada: o pão nosso de cada dia, o
vinho, a cerveja.
Uma das últimas cidadelas assediadas foi um reduto sagrado do homem gaúcho, o
chimarrão. O assalto começou no último quartel do século vinte, fora das fronteiras do
Rio Grande do Sul. A Ervateria Escoteiro, de Santa Catarina, ganhou autorização para
produzir erva mate misturada com açúcar. Na época não houve reação significativa. Bastou a quinta colunista Ervateria Rei Verde, de Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, também assegurar o registro no Ministério da Saúde e passar a comercializar um produto
com 3% de açúcar (a portaria ministerial autorizava a adição de até 5%) em 1995 para que a
concorrência fosse atiçada. E a corrida ao açúcar ganhou novos adeptos, quer dizer, traidores.
Claro que os gaúchos legítimos, de boa cepa, não ficaram de braços cruzados diante
dessa ignomínia. Isso é fraude contra uma tradição e pode trazer prejuízo à saúde da
população , reagiu indignado o diretor do Sindicato das Indústrias de Mate e um dos
líderes do movimento contra o açúcar, Lúcio Flávio Metsclerf. Ao que acrescenta o
gaudério missionário fundamentalista Dorival Berkai, vulgo Estampa de Gaúcho: O
Gaúcho que tomar mate doce não leva muito tempo para apanhar de tamanca da
mulher .144
143 Dalla Via, Gudrun. Las combinaciones alimentícias. México: Ibis, 1989, p. 20. 144 Fonte: Zero Hora versão digital.
Essa batalha os gaúchos venceram. O chimarrão não foi conspurcado com a adição
de açúcar. Quem quiser pode misturar erva-mate com açúcar, mas não pode chamar isso de
chimarrão.
Essa derrota histórica que a vanguarda do povo gaúcho infligiu à ditadura do açúcar
foi consagrada em Resolução da Anvisa, a RDC número 302 de 07/ 11/ 2002.145 Segundo
esse documento, chimarrão e tererê por definição legal não contêm açúcar. A ditadura do
açúcar ao inventar a erva-mate-com-açúcar cometeu um atentado violento ao pudor, mas
gaúchos de verdade conseguiram evitar o estupro: a honra foi preservada, uma
demonstração de hombridade do homem gaúcho. O mesmo não se pode dizer dos
gaúchos ligados ao vinho, que abriram as pernas para os homens da ditadura do açúcar.
E para reforçar a tese de que os gaúchos são a vanguarda do povo brsileiro na luta
contra a ditadura do açúcar. Em 2003 o Conselho Regional de Odontologia (CRO-RS)
realizou o Iº Fórum Estadual Açúcar X Saúde, no Teatro Dante Berone da Assembléia
Legislativa. O Fórum teve por finalidade alertar, conscientizar e informar a população
sobre os efeitos do consumo de açúcar na saúde. O presidente de honra do Fórum foi o
deputado Adroaldo Loureiro, do PDT , que é cirurgião-dentista e autor de um projeto de
lei que limita a quantidade de açúcar na merenda escolar das escolas da rede pública. As
conclusões do evento foram encaminhadas ao Governo do Estado, especialmente às
secretarias de saúde e educação. Chama atenção o fato de um fórum intitulado Açúcar X
Saúde ter sido iniciativa do pessoal da odonto e não da ciência da nutrição, da diabetologia, da endocrinologia e outros. É que o calcanhar-de-aquiles da ditadura do açúcar é a cárie
dentária. A culpa do açúcar em relação ao diabetes, à obesidade e outras doenças crônicas
ainda está envolta numa cortina de fumaça. Mas assim como o gangster Al Capone foi
preso, não pelo FBI ou a Interpol, mas pelo imposto de renda. Podemos atacar a ditadura
do açúca por conta da epidemia de cárie.
Ciência ocidental e sabedoria oriental
Ambos já falecidos, um era médico americano e o outro filósofo naturalista japonês. E, mutatis mutandi, tinham a mesma dúvida. Robert Atkins: Se a dieta para o diabetes que
se instala no adulto tivesse sido livre de carboidratos desde a infância, aquele gene teria se
manifestado? Podemos somente especular, mas sabemos que o diabetes não existe em
culturas onde carboidratos refinados não são consumidos ; Georges Ohsawa: E por que
razão não proibir o uso generalizado do açúcar como alimento, eliminando, assim, para
sempre o perigo de adquirir diabetes? . Atkins, autor da famosa dieta de carnes e gorduras, acreditava na história da
carochinha da predisposição genética e embora chamasse o açúcar de carboidrato
assassino a bronca dele era contra os carboidratos em geral.
Para Ohsawa, criador da macrobiótica, o açúcar seria um fator de risco que eliminado
afastaria o perigo da doença.
Faço a síntese entre a ciência ocidental e a sabedoria oriental: O açúcar é o produto
químico barato que, travestido de alimento, impregna a alimentação do homem moderno, transformando-a na ração patogênica que empurrou a humanidade para a era das doenças
crônicas, metabólicas e degenerativas. Se a humanidade quiser se livrar das vergonhosas
epidemias de cárie dentária, obesidade, hipertensão, diabetes etc. terá que deter o avanço da
ditadura do açúcar e jogar no lixo esse corpo estranho doce e nocivo. Com açucareiro e
tudo!
145 Fonte: página da Anvisa na internet.
EPÍLOGO
O açúcar é o mais dissimulado ópio do povo.
Da apresentação do livro Sugar blues
Aonde se esconde o açúcar, ou rasgando a cortina de açúcar
A essa altura do campeonato já é possível tirar algumas conclusões. Relaciono
abaixo, praticamente recapitulando, os escudos, os disfarces, as artimanhas e os bodes
expiatórios que permitem que o açúcar continue em sua trajetória malfazeja. Esses
expedientes todos formam a Cortina de Açúcar . Ela é mais sólida que a velha Cortina de
Ferro do tempo da Guerra Fria.
A de açúcar encontra-se enraizada na sociedade e no Estado, legitimada pelo
folclore e pela literatura, inclusive a científica, e impregna os corações e as mentes de donas
de casa, médicos e nutricionistas.
O paladar e o instinto. Infelizmente a ditadura do açúcar conta com essa
importante ajuda da própria fisiologia humana. As pessoas, naturalmente, acham mais
agradável o sabor doce em comparação com o ácido, o salgado e o amargo. O sabor doce é
também tão mais agradável quanto mais doce for (até o limite do enjoativo). Já os outros
sabores tendem a ser agradáveis em baixas concentrações e muito desagradáveis em
concentrações altas. Especialmente o amargo que é o gosto da maioria dos alcalóides
venenosos. Aqui é o instinto de sobrevivência em ação.
A gordura. Gordura é um alimento de importância fundamental para a
humanidade, mas tem sido diabolizada pela indústria da doença a ponto de ser o principal
bode expiatório dos males provocados por um troço que nem alimento é. Com todo
mundo preocupado com a gordura, o açúcar fica de mãos livres para continuar fazendo
mal aos outros.
O colesterol. Nem sequer é gordura, mas é também usado como coadjuvante da
gordura. Tanto a gordura quanto o colesterol ainda hoje são usados como bodes
expiatórios pela indústria da doença. Nos Estados Unidos dois médicos feriram
mortalmente esse estratagema, os doutores Robert Atkins e Kilmer McCully. Sobre a farsa
montada em torno do colesterol recomendo a leitura deles dois e mais de Thomas J. Moore, cujos livros estão incluídos na bibliografia no final deste volume. Agora mesmo o
médico brasileiro Sérgio Puppin acaba de lançar o livro Ovo: o mito do colesterol.
Os triglicerídeos. Palavrão muito usado pela diabolização da gordura. É outro
coadjuvante.
As frituras. Outra paranóia criada pela indústria da doença, batata frita é a bola da
vez. Fritura em si não tem problema. Agora pegue qualquer alimento (carboidrato, gordura
ou proteína), acrescente açúcar e aqueça (cozimento, assadura ou fritura). O resultado será
o surgimento de substâncias cancarígenas provocadas pela reação de Maillard que ainda
não foi completamente mapeada pela bioquímica.
A predisposição genética. Se dez pessoas levarem uma paulada na cabeça e três
morrerem, pode-se dizer que essas três tinham predisposição genética a morrer de
paulada na cabeça? Sendo o açúcar um agressor do organismo, suas vítimas não podem ser
acusadas de portadoras dessa predisposição. Essa é outra explicação muito apreciada
pelos cientistas a serviço da ditadura do .açúcar. É pau pra toda obra: como não acham um
gene apelam para a predisposição genética . Seu avô e seu pai ficaram diabéticos porque
comeram açúcar cada um por seu turno. Segundo os médicos o diabetes só ocorre em
quem tem essa predisposição. Fica implícito que pessoas normais estão liberadas para
comer açúcar.
Os maus hábitos alimentares. Este foi um achado e tanto da indústria da
doença, botando a culpa das mazelas da humanidade, cuja causa principal é a dieta
açucarada, nos maus hábitos alimentares . Com isso a ditadura açucareira atingiu dois
objetivos, eliminou o pressuposto perigoso, que era o de considerar patogênica a dieta
( moderna ou ocidental - algum chato poderia querer saber o por quê disso), e botou a
culpa na própria vítima dessa dieta. Maus hábitos alimentares significam comer açúcares e
gorduras em excesso . Enquanto isso as pessoas de bons hábitos alimentares podem comer
açúcar normalmente.
O estilo de vida sedentário. Este é o irmão gêmeo dos maus hábitos
alimentares : são apresentados sempre juntos como responsáveis pela obesidade e seus
corolários. O sujeito come açúcar, fica doente e a culpa é dele mesmo por ser guloso (mau
hábito alimentar) ou preguiçoso (estilo sedentário). Fica subentendido que pessoas bacanas
e dinâmicas podem comer açúcar normalmente.
A abundância e constância da oferta de comida. Esta é uma desculpa nova
usada pela indústria da doença. As pessoas ficam doentes porque comem demais, refrigerantes, pipocas e batatas são oferecidos em baldes a toda hora, a todo mundo, em
todo lugar . O açúcar nesse esquema fica como um sujeito oculto. Nesse caso a vítima não
possui maus hábitos, é um idiota completo que, se lhe forem oferecidos um balde de Coca- Cola e um hambúrguer de um palmo de altura, ele come tudo. O recado é o seguinte: desde
que não sejam servidos em baldes os refrigerantes, tortas de maçã e milk shake são bem- vindos.
O excesso de açúcar. Este é o artifício ideológico mais largamente utilizado pelos
médicos para proteger o açúcar. O conceito de excesso de açúcar é para induzi-lo a pensar
que existe um consumo normal de açúcar. A teoria dos açúcares. A floresta de açúcares : o açúcar do leite, o do malte, o do
amido, a glicose, a frutose, a xilose, a ribose e a arabinose ajudam a confundir e a camuflar
o açúcar do açucareiro, o único que faz mal ao ser humano.
Os fatores ambientais. Os médicos da tendência Ecologia clínica, em virtude do
ponto-de-vista holístico, deixaram de lado o conceito de dieta patogênica; para eles a causa
das doenças é o ambiente pan-patogênico do mundo de hoje, pós-industrial. O açúcar é
um fator de doença no meio de um mar de outros fatores que inclui micro-ondas, raios-x,
aditivos químicos, ar poluído, ruídos, fumaça etc. O açúcar é apenas um figurante anônimo
nessa superprodução. Portanto, pode continuar fazendo mal sem levantar suspeita.
O açúcar mascavo. O açúcar mascavo, por incrível que pareça, ajuda o açúcar a
continuar fazendo mal à humanidade. O açúcar refinado aparece como um açúcar que não
deve ser consumido por algumas pessoas em virtude de razões de saúde (os diabéticos) ou
de estética (os vaidosos). Ou seja, pessoas gozando de boa saúde e sem frescuras com
estética tudo bem, podem comer açúcar à vontade. Para aquelas resta o consolo de um
açúcar saudável, o açúcar mascavo, xodó dos naturalistas.
As frases feitas. Elas também ajudam a facilitar a vida do habitante do açucareiro. Outro dia ofereci a uma amiga uma xícara de café com leite sem açúcar. Ela provou, torceu
o nariz e recusou dizendo de amargo já basta a vida . Pensei: coitada, mal sabe ela que é
justamente o doce do açúcar que torna sua vida amarga no mau sentido.
A central de boatos da indústria da doença está tentando popularizar a expressão
doce sem açúcar para designar algo sem graça pela falta de um ingrediente indispensável, espécie de substituto de expressões como forró sem mulher ou gato sem unha . Mas os
homens da ditadura se deram mal porque já existe um movimento em torno da idéia de
doce sem açúcar, ou seja, doces saudáveis feitos com mel, frutas ou adoçantes. Livres do
agente adoçante patogênico do açucareiro. Há páginas na internet que oferecem receitas e
cursos de doces sem açúcar.
Os adoçantes. Ajudam a dar vida longa ao rei açúcar mesmo sem querer. Associados ao câncer - a acusação é falsa mas ainda flutua no inconsciente coletivo, fazem
com que as pessoas prefiram o açúcar natural da cana . Para evitar o câncer fictício dos
adoçantes as pessoas encaram a realidade das cáries, da obesidade mórbida etc.
O sal Ajuda o açúcar como um inocente útil conferindo-lhe legitimidade: ambos
são pós brancos com sabores antípodas. Ultimamente o sal tem ajudado o açúcar como um
co-vilão. O açúcar provoca doenças ? O sal também. Isso serve para atenuar os crimes do
açúcar. Na verdade o sal é necessário ao organismo em pequena quantidade e em excesso
faz mal. O açúcar é absolutamente desnecessário e patogênico em qualquer quantidade.
O mel Uma propaganda recente do Ministério da Saúde mostra um coraçãozinho
vermelho animado pedindo aos diabéticos moderação no consumo de açúcar... e mel. A
ditadura do açúcar não permite que se aponte para o agente responsável pelo caráter
patogênico da dieta humana. Para esvaziar a denúncia o meliante é sempre apresentado ao
lado de inocentes alimentos que sempre fizeram parte da mesa da humanidade: o sal, a
gordura e até o mel.
Os inimigos brancos. Há um folclore no ar que diz que certos sujeitos
brancos são vilões para a saúde: o sal, o leite, o pão e o açúcar brancos. Pois bem, desses
branquelos todos só um é um produto químico nocivo à saúde. Os demais são alimentícios,
uns mais, outros menos. Uma variante diz que os três malfeitores são açúcar, sal e cocaína.
Dos dois venenos dessa lista o pior é o açúcar; pelo menos ninguém coloca cocaína na
mamadeira dos bebês.
O maquiavelismo dietético. É o uso dos sabores fortes, ácidos, amargos, salgados e até apimentados para abafar o dulçor com o objetivo de empurrar mais açúcar
pela goela da humanidade. Exemplos: para adoçar o arroz do português acrescente açúcar. Para adoçar o arroz do japonês acrescente mais açúcar e, para abafar: vinagre, sal e
pimenta. O café bem forte e amargo é um ótimo pretexto para o uso de maior quantidade
de açúcar.
A cortina de fumaça. De vez em quando a gente lê em jornais e revistas
reportagens sobre pesquisas alopradas dando conta do mal que ora o pão, ora o leite, ora a
carne ou a gordura fazem. Já vi gente fazer restrição a tudo que é tipo de alimento - ovo, tomate, amendoim, abacate. Tais pesquisas lançam dúvidas sobre alimentos básicos da
humanidade. Em minha opinião trata-se da criação de uma cortina de fumaça; de criar um
clima de insegurança, de incerteza e de confusão com o objetivo de deixar livre o agente
patogênico da dieta. Trata-se de esvaziar as denúncias sobre o açúcar que fica como algo
que até pode fazer mal, mas o que não faz mal nessa vida? . A cultura da morte. É uma ideologia, um conjunto de valores que tem a ver com
o comportamento ultraindividualista, autodestrutivo, altrudestrutivo (destruição do outro) e
ecodestrutivo (destruição da natureza); a banalização e o paroxismo da violência. É a
cultura típica da atual fase do capitalismo na qual a podridão das elites contamina todo o
organismo social. A cultura da morte leva as pessoas às drogas, as propriamente ditas e as
permitidas: cigarro, álcool, e a pior de todas, porque é dada até aos bebês, o açúcar. Essa
cultura é responsável pela banalização da morte, que se torna uma presença constante no
cotidiano das pessoas. Com as pessoas convivendo com a idéia da morte instantânea, dizer
que o açúcar mata lentamente faz rir.
Doce holocausto
De holocausto em holocausto, assim caminha a humanidade. Aconteceram
holocaustos na Antigüidade, na Idade Média e na Idade Moderna. E há holocaustos
acontecendo sob nossos olhos.
O holocausto mais famoso é o judeu, patrocinado pelos nazistas. Assim como
Gillette virou sinônimo de lâmina de barbear, holocausto é quase sinônimo de holocausto
judeu. A África é o paraiso dos holocaustos, mas como lá só tem negros, nós os brancos
não enxergamos o que acontece por lá, tudo fica no escuro.
Hoje os judeus patrocinam o holocausto palestino.146 Foram lançados recentemente
dois livros intitulados de livros negros : um dá conta do holocausto que resultou das
revoluções comunistas, e o outro o concomitante a expansão do capitalismo. O livro
negro do comunismo é mais grosso que o livro negro do capitalismo.
Quem gosta dessa contabilidade macabra é o filósofo Olavo de Carvalho. Para mim
o holocausto capitalista é imbatível, até porque o capitalismo já tem alguns séculos de
existência e o comunismo só não é uma experiência com começo, meio e fim porque ainda
restaram os regimes da Coréia do Norte, Cuba e China. Sendo este um mistério histórico, um comunismo de mercado.
O holocausto capitalista deve incluir em sua contabilidade as vítimas das guerras
cujo fim último era implantar o modo capitalista de produção, como as Guerras
Napoleônicas ou a Guerra da Secessão. Aqui no Brasil a República capitalista esmagou
Canudos e Contestado. Agora somem-se todas as pessoas que o capitalismo teve que
liquidar para poder se implantar em todos os países em que hoje funciona o regime
capitalista. É gente que não acaba mais. Agora somem as pessoas que morrem
normalmente com o regime funcionando. Lembro que em plena Ditadura de 64 dizia-se
que no Brasil crianças de até cinco anos de idade morriam de fome ou de doenças em
conseqüência da inanição a um ritmo de uma a cada minuto. Vítimas do milagre capitalista
verde-oliva
O holocausto capitalista é tão grande e abrangente que engloba outros menores
dentro dele, ou sub-holocaustos. É o caso do holocausto negro e do indígena. A escravidão
dos africanos deve-se basicamente ao comércio de açúcar. O próprio holocausto judeu é
um sub-holocausto capitalista. A não ser que a nova ordem que Hitler pretendia
implantar abolisse a propriedade privada e seu regime fosse uma espécie de socialismo. Acho que não, a nova ordem dele no fundo era a velha ordem capitalista monopolista com
altas doses de autoritarismo. A marca nacional- socialismo era para enganar o trabalhador
alemão.
Essa digressão holo-cáustica é para apresentar um holocausto oculto ainda maior
que o capitalista, o holocausto sacarino. Já vimos que a invasão da mesa da humanidade
pelo açúcar originou a ração patogênica que inaugurou a era das doenças crônicas, metabólicas e degenerativas. O holocausto sacarino imola as vítimas da dieta açucarada
moderna, todos aqueles que morreram em conseqüência de doenças não transmissíveis. É
uma mortandade que começou na Europa no século XVI e atravessou os séculos XVII, XVIII, XIX, XX e adentrou o século XXI , expandindo-se para abranger todo o planeta e
num crescendo de intensidade para alcançar toda a raça humana, do pigmeu ao esquimó e
do bebê ao ancião.
Cheguei a pensar se o holocausto sacarino não seria um sub-holocausto capitalista, mas como Cuba, União Soviética e China produziam e consumiam açúcar o holocauso
sacarino estava acima do modo de produção.
146 No tempo de Lênin os dias da História se contavam de dez em dez anos. Hoje registra-se com a ajuda de um cronômetro digital. Neste momento judeus e palestinos estão (aos trancos e barrancos)
empenhados em seguir juntos o Mapa do Caminho.
A dieta açucarada é responsável por uma série de epidemias em cascata: cárie
dentária, obesidade, doenças micro e macro-vasculares agudas ou crônicas e doenças
metabólicas. E cada uma dessas doenças responde por uma série de outras que lhe são
secundárias , ou ainda por graves complicações que levam à morte ou à morte em vida, quando o sujeito fica apenas mutilado. A mais difundida e vergonhosa das epidemias, a de cárie dentária, uma forma de
mutilação que atinge uns seis bilhões de almas, é uma porta aberta para inúmeras doenças, inclusive do coração, que são mortais. O diabetes, doença sistêmica que compromete todo
o sistema vascular, dos capilares aos grandes vasos coronarianos, é a principal causa de
retinopatia, nefropatia e amputações de membros inferiores. Além de 80% dos diabéticos
estarem propensos a morrer de doenças cardiovasculares, e 50% dos homens e 30% das
mulheres terem mais chances de morte súbita. O risco de insuficiência cardíaca é duas a
três vezes maior entre diabéticos e derrames são duas vezes mais freqüentes em diabéticos
hipertensos. Estima-se que em 2025 o mundo terá 300 milhões de diabéticos.147 Obesidade
e hipertensão igualmente expõem as pessoas a uma infinidade de riscos.
O holocausto sacarino é o mais terrível de todos os holocaustos. É desses
holocaustos que estão se desenvolvendo sob nossos olhos e, o pior de tudo, suas vítimas
lambem os beiços enquanto são sacrificadas.
O custo humano e ecológico do açúcar
Nenhuma barrica de açúcar chega à Europa isenta de sangue.
Helvétius
Durante o século XVI a Europa comprava especiarias da Índia, mercadorias da
China, e roubava ouro e marfim da África. O açúcar já era conhecido há séculos, mas era
uma especiaria raríssima e caríssima. Depois que os portugueses aprenderam a fabricá-lo e
especialmente depois de descoberto o Brasil e da brilhante idéia de produzir açúcar aqui, essa mercadoria começou a deixar de ser um luxo de poderosos e a ser consumida por
massas cada vez maiores de europeus. E como ainda era cara tratava-se de um bom
negócio, certamente um excelente negócio, tanto que era disputado a tapas, ou melhor a
canhoneiras, por espanhóis, portugueses, holandeses, franceses e ingleses - e, no meio do
tiroteio, índios e negros. A zona açucareira segundo Nelson Werneck Sodré era um
cenário de guerra quase permanente.148
Para produzir açúcar no Brasil era necessária uma força de trabalho abundante e
barata. Ia ser difícil levar homens livres da Europa para trabalharem para um latifundiário
no Brasil; eles estavam mais inclinados a vir em busca de um pedaço de terra para cultivar
visando o enriquecimento próprio. O índio foi escravizado por um curto período, mas era
difícil convencê-lo a trabalhar na fabricação de açúcar, e além do mais a Coroa Portuguesa
não ganhava nada com isso.
Para sustentar a produção de açúcar foi criado o tráfico de escravos negros da
África, a maior migração forçada que a História registra , ainda segundo Werneck Sodré. A Metrópole portuguesa vendia caríssimo as concessões para a exploração do
tráfico negreiro, e com isso ganhava dinheiro nas duas pontas, no tráfico de açúcar e no de
negros.
147 Fonte: www.roche.com.br. 148 Sodré, Nelson W. Formação da sociedade brasileira. Rio de Janeiro: José Olimpyo, 1944, p.110.
O tráfico tinha um desenho triangular, os capitalistas que o exploravam levavam da
Europa tecidos baratos e bebidas alcoólicas para a África; lá enchiam o porão dos navios de
negros que eram levados para a América como escravos; e voltavam para a Europa com os
navios cheios de açúcar.
O negro africano também não se dispunha a trabalhar de bom grado para o senhor
de engenho. As condições de trabalho na produção de açúcar nos tempos coloniais eram
duríssimas. Vejamos o testemunho do cronista francês Pierre Morreau, que esteve no Brasil
entre 1646 e 1648: Se alguém deixasse de executar no tempo prescrito o que havia sido
determinado, era amarrado e garroteado, na presença de todos os outros escravos reunidos,
e o feitor ordenava ao mais forte e vigoroso que desse, sem interrupção, no faltoso
duzentas a trezentas chicotadas, desde a planta dos pés até a cabeça, de sorte que o sangue
escorria de todas as partes; a pele toda rasgada de golpes era untada com vinagre e sal, sem
que ousassem gritar ou gemer, sob pena de receber o dobro. Algumas vezes, segundo a
gravidade da falta, esse castigo, ou melhor essa tortura, era repetida dois ou três dias
consecutivos. Ao sair dali eram presos em lugar escuro e, no dia seguinte, mais submissos
que uma luva, eram reenviados ao serviço .149 Diante de tais argumentos o negro africano
foi persuadido a trabalhar no fabrico de açúcar.
Desde que eram capturados no meio do mato, por seus próprios irmãos de cor, lá
na África, e trocados por bugigangas, os negros eram jogados num navio, não à toa
chamado de tumbeiro, que saía da África lotado de homens e chegava ao Brasil com 30 ou
40% deles a menos - morriam na viagem, de fome ou maus tratos. No canavial
trabalhavam como burros de carga 14 horas por dia. Sua vida útil variava de sete a dez
anos.
A produção de açúcar exigia a plantação de extensos canaviais. Como disse
Gilberto Freyre, o canavial entrou aqui como um conquistador em terra inimiga: matando
as árvores, secando o mato, afugentando e destruindo animais e até os índios .150 O
canavial destruiu 3/ 4 partes da Mata Atlântica nordestina pela queimada. Ainda nas
palavras de nosso sociólogo poeta, a fogo é que foram se abrindo no mato virgem os
claros por onde se estendeu o canavial civilizador mas ao mesmo tempo devastador . A monocultura da cana destruiu, em grande parte, a diversidade biológica da Zona
da Mata. Com a destruição das matas para a cana dominar sozinha, o roxo dessa terra nua
(crua), a natureza do Nordeste - a vida toda deixou de ser um todo harmonioso para se
desenvolverem relações de extrema ou exagerada subordinação: de umas pessoas a outras, de umas plantas a outras, de uns animais a outros; da massa inteira da vegetação à cana
imperial e todo-poderosa; de toda a variedade da vida humana e animal ao pequeno grupo
de homens brancos , conclui Gilberto Freyre. Ao custo dessa matança de índios, da destruição de florestas, da biodiversidade e do
solo, do desequilíbrio ecológico e meteorológico, e do fato de milhões de negros terem
sido arrancados de sua terra natal para serem queimados como carvão nos fornos dos
engenhos de açúcar, os portugueses produziram muito açúcar que ia parar na Europa.
Os portugas produziam o açúcar bruto e capitalistas holandeses refinavam-no e
revendiam-no para o resto da Europa. Os holandeses, por ocasião da União Ibérica, com
medo de perderem para a Espanha sua fonte de matéria-prima, decidiram invadir e tomar
na marra o filé mignon da zona açucareira do Brasil, Pernambuco e adjacências. Depois
essa região voltou para as mãos de Portugal mediante novas e memoráveis guerras.
149 Apud Avancine, Elza G. Doce inferno. São Paulo: Atual, 1991, p. 51. 150 Freyre, Gilberto. Nordeste. Rio de Janeiro: José Olimpyo, 1937, p. 95.
Isso tudo aconteceu no contexto do latifúndio, da escravidão, da monocultura de
cana e do engenho de açúcar.
Fecha o pano e vamos dar um pulo para outro cenário, poucos séculos depois.
O latifúndio continuou o mesmo, o Brasil continua sendo o país em que se
encontram as maiores propriedades do planeta, extensões de terra nas quais cabem países
europeus. Não à toa é no Brasil que existe também o maior movimento de trabalhadores
sem terra do mundo, agricultores que não dispõem de uma nesga de terra para plantar, num país de dimensões continentais.
A monocultura, em linhas gerais, continua. Talvez seja melhor falar em
oligocultura, posto que outras culturas entraram na concorrência: laranja, café e soja. O
Brasil tem vocação para ser o grande celeiro do mundo. Ainda hoje é o maior produtor
mundial de cana-de-açúcar. O trabalho não é mais escravo desde 1888, embora de vez em
quando apareçam na imprensa denúncias da prática da velha e humilhante forma de
escravidão por dívidas ou em troca de um prato de comida. Nas modernas usinas de
açúcar as condições de trabalho não mudaram muito em relação ao antigo engenho
colonial, tanto que o ambiente do engenho o padre Vieira o chamou de doce inferno e os
trabalhadores da usina chamam de vapor do diabo a neblina quente que impregna a
fábrica e que eles respiram. E lá fora no canavial ainda existe o trabalhador temporário, o
bóia-fria, alusão à marmita que ele não tem o direito de esquentar para comer.
A destruição da natureza continua, lixiviação do solo, devastação de matas ciliares, contaminação de águas, solo e alimentos. As grandes extensões de plantação de cana
continuam a fazer o mesmo mal ao ecossistema que sempre fizeram. O capim gerador de
açúcar e álcool continua a se expandir substituindo culturas de alimentos. E agora com a
ajuda da ciência estão pretendendo transformar a região do cerrado brasileiro num imenso
canavial de cana transgênica.
Para produzir mais de 15 bilhões de litros de álcool e conseqüentes quase 200
bilhões de litros de vinhoto
151
, quase 25 milhões de toneladas de açúcar, o Brasil sacrifica
quase 5 milhões de hectares de terra fértil e gera uma cordilheira de bagaço de cana. São
perto de 500 milhões de toneladas de cana que viram bagaço. Agora mesmo a ditadura do
açúcar está tentando viabilizar uma indústria poluente de geração de energia a partir da
queima desse bagaço. Espero que pelo menos o Partido Verde ponha a boca no trombone. E estava preparando-se para avançar sobre o Pantanal matogrossense. Queria instalar 23
usinas de açúcar e álcool no Planalto Matogrossense. Essa intentona dos fabricantes de
açúcar colocou em rota de choque o governador local Zeca do PT e a Ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva.
A agroindústria da cana de açúcar já está instalada no Mato Grosso do Sul. O
problema é que os usineiros queriam ampliar seus negócios e leis estaduais estavam
obstaculizando seus planos. Zeca do PT então enviou à Assembléia Legislativa um pojeto
de lei que facilitaria a vida dos usineiros. Marina Silva, sabendo disso, fez oposição.
Zeca do PT tentou desqualificar a ministra acusando-a de ter um ponto de vista
amazônico e de não conhecer a realidade do Pantanal. Ora, amazônico significa amplo, sem querer Zeca elogiou a ministra. Já ele revelou-se um pangaré de antolhos no que diz
respeito à ecologia.
151 Recentemente uma usina despejou um caldo num rio matando os peixes. Alguém da usina disse
que era melaço, mas provavelmente era vinhoto, resíduo poluente. Para cada litro de álcool
produzido restam 15 litros desse produto.
Do altiplano, onde seriam instaladas as usinas, partem importantes afluentes dos
rios Paraná e Paraguai. Para cada litro de álcool produzido sobram uns 15 litros de um
subproduto poluente: o vinhoto. Sem contar os herbicidas, pesticidas e fertilizantes
utilizados nos canaviais. Conhecendo a consciência ecológica do agronegócio brasileiro, o
destino desse material poluente seriam os rios. Seria o começo do fim do Pantanal
Matogrossense.
Diante do poderoso grupo de pressão das indústrias de açúcar e do fato de que
Zeca do PT conta com a maioria dos deputados, a violência contra o Pantanal parecia
líquida e certa. Para barrar esse processo o militante ecológico, Francisco Anselmo Gomes
de Barros, conhecido como Franselmo, ateou fogo ao próprio corpo durante manifestação
popular de protesto contra a instalação das usinas, na cidade de Campo Grande, em 13 de
novembro de 2005.
Graças a esse gesto extremo o projeto da ditadura do açúcar foi arquivado. Franselmo imolou a própria vida para salvar a natureza. Nas cartas que deixou ele dizia:
Hoje somos passados para trás por interesses de maus políticos, maus empresários e
PhDs de aluguel. Em termos de Brasil, estamos vendo o barco afundar e ninguém diz
nada . Franselmo deixou mulher e uma filha. Este livro é sobre açúcar enquanto componente da dieta. Num primeiro
momento a luta é para impedir que o açúcar vá parar na barriga das pessoas. Mais adiante
talvez seja o caso de se extender a luta contra a idéia do álcool como substituto do
petróleo. Porque diante disso tudo fica a pergunta: de um ponto de vista humano- existencial vale a pena tanto sofrimento, tanta destruição da natureza se arrastando já há
séculos? Se fosse para alimentar a humanidade, estaria justificado. Mas para alimentar o
tanque de combustível de automóveis particulares, para causar as mais vergonhosas
epidemias da humanidade, e encher de dinheiro os cofres dos traficantes de açúcar, é um
pouco demais... um pouço demais... um pouco demais.
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